LITERATURA INFANTOJUVENIL


MEUS ENCONTROS AMOROSOS COM ESCRITORES

Essa semana soube que vou realizar um sonho antigo. Vou ministrar uma disciplina no curso de Biblioteconomia da Universidade Estadual de Londrina que tratará do mundo maravilhoso da literatura infantil e juvenil desde seus mais remotos tempos. Minha intenção é levar os futuros bibliotecários a conhecer as principais obras e autores do Brasil e fora dele para que eles possam com esse conhecimento serem capazes de formar acervos em diferentes espaços.

 

Para entrar na atmosfera, fiz um retrospecto do meu envolvimento com a literatura infanto-juvenil desde sempre. No meu caso sempre significa final da década de 70.

 

Pensando, divagando, viajando mentalmente, me encontrei com algumas cenas engraçadas e relaxantes que agora compartilho com você.

 

Farei isso de forma muito verdadeira, mas é possível que você não acredite em tudo o que eu contar...

 

Começo com um mico de alta escala...

 

Estava eu na Bienal Internacional de São Paulo circulando pelos stands para encontrar um livro para filha de uma amiga. De repente minhas orelhas em pé, como um cão farejador, ouviram saindo da boca de uma senhora, exatamente o nome da editora que eu estava procurando – Miguilim.

 

Parei, pedi desculpas por interromper uma conversa, mas havia ouvido a palavra mágica que me levaria a solucionar um problema – localizar um livro que eu amava muito e queria comprar para a filha da amiga.

 

Desculpas aceitas a elegante senhora me perguntou qual era o livro que eu estava procurando. Respondi – A vó da vó da minha vó. A senhora educadamente me disse que o título correto era: A mãe da mãe da minha mãe e complementou - sou a autora.

 

Que mico delicioso! Naquele instante estava conhecendo Terezinha Alvarenga, uma pessoa que muitos anos depois me deu o maior apoio quando resolvi abrir uma livraria infanto-juvenil em Londrina.

 

Quando conheci o Ziraldo também foi muita emoção. Novamente estava eu numa Bienal Internacional de São Paulo, dessa vez em 1986, quando decidi caçar um autógrafo do Ziraldo. Entrei numa fila e nela fiquei 45 minutos na maior expectativa para me aproximar do meu ídolo. Enquanto esperava fui montando uma estratégia para conseguir convencer o Ziraldo para uma atividade no SESC de Londrina. Preparei mentalmente várias abordagens, mas quando cheguei perto só consegui dizer: - Ziraldo, tenho muita vontade que as crianças de Londrina te conheçam, topas!? Ele olhou pra mim, colocou a mão no braço da assessora da editora Melhoramentos que estava ao lado dele e disse: - pode marcar! Dois meses depois estávamos no calçadão de Londrina fazendo a maior festa e comemorando o aniversário dele!

 

Surpreendente também foi meu encontro, em 1987, com a escritora Angela Lago, uma ilustradora mineira que estava assistindo, no fundo de uma sala do II Congresso Brasileiro de Literatura Infantil e Juvenil em Niterói, uma palestra a respeito de Lygia Bojunga Nunes. Eu também estava lá. A palestra que estávamos ouvindo era tão equivocada que um leitor desavisado quase foi impelido a desistir de ler os livros da Lygia do que desejar debruçar-se sobre eles com sede, muita sede. Estávamos lado a lado, mas não nos conhecíamos. De vez em quando uma olhava para outra com um olhar reprovador. Saímos dali e ela me convidou para o lançamento de um livro dela que iria acontecer no outro dia. Fui e nunca mais parei de colecionar seus livros. Numa das feiras do SESC fiz contato para trazê-la à Londrina, mas houve um arrocho econômico no Brasil e tive que cancelar. Ainda acalento esse desejo!

 

Nesse mesmo evento, ao ver uma senhora numa sala lotada procurando um lugar para sentar, espevitada como sou, subi no patamar de uma janela. Nem imaginava que naquele instante iria conhecer Glória Kirinus uma poeta peruana-brasileira que depois trouxe à Londrina para oficinas chamadas “Lavra Palavra”, despertando nos participantes uma verve poética que as pessoas nem sabiam que tinham.

 

Tem o Hardy Guedes! Na verdade, conheci primeiro o representante de uma editora em Curitiba, para depois conhecer o escritor. As obras infantis desse autor eu tenho todas e seus Cds também. Mas a maior emoção foi o dia em que ele me entregou seu samba-enredo em homenagem a Livraria Maluquinha. Tentamos organizar um bloco infantil para sair no carnaval. Esse sonho não foi possível realizar, mas a música está guardada num papel amarelado e quando tenho saudade abro e ainda ouço a voz e o violão desse compositor paranaense (ops! agora não sei mais se é paranaense, pois está compondo e tomando água de coco nas terras nordestinas).

 

Agora, conhecer a escritora Eva Furnari é indescritível. Essa é uma escritora paciente, pois durante vários anos recebeu meus telefonemas com convites para vir à Londrina. Telefonemas esses que ela recusava como uma perfeita lady, explicando que seus filhos ainda eram pequenos. Mas quando ela pode vir à Londrina, você não imagina a alegria. Minha amiga fez uma bruxa de pano, igual a do livro Truks e sai endoidecida de escola em escola convidando crianças e adultos para um encontro com Eva Furnari. Foi ótimo!

 

Trazer Luis Camargo numa Feira do SESC foi como acionar uma bomba energética, nunca, até então havia conhecido um escritor tão agitado. Fui buscá-lo no hotel antes do horário marcado. Não estava, pois já havia saído com um saco nas costas carregado de objetos que ele usava para contar a história do seu livro Maneco caneco chapéu de funil. Corri atrás dele e lá fomos nós pelo calçadão de Londrina ao encontro das crianças. As crianças e adultos se integraram com esse escritor de uma forma natural e espontânea. Mas um grupo recebeu dele uma atenção especial, foram os alunos da APAE. Com eles foi uma entrega total, nunca vi e possivelmente não verei, um envolvimento como aquele. Objetos virando personagens passando de mão em mão e despertando muitos sorrisos.

 

Liliana Iacocca veio à Londrina sem seu marido Michele, que era seu ilustrador, mas trouxe seu filho que na época devia ter uns 10 anos. Também foi um alvoroço. Ela, uma senhora alta (ou será que era a grandeza dela) com um leve falar macarrônico e de uma simpatia contagiante. Ele, um menino que ficava sempre por perto observando como sua mãe era admirada pelos seus leitores mirins e por um bando de mediadores de leitura que, assim como eu, lia e divulgava a sua obra. Hoje ela já não se encontra entre nós, mas seus livros, pelo que observo continuam nas mãos das crianças nas bibliotecas.

 

Outro que se foi muito cedo é o Carlos Queiroz Telles, dono de um humor transbordante e que eu e a minha amiga e bibliotecária Rita de Cássia Meneghetti, recebemos, da distribuidora Moderna, a incumbência de “paparicar”. Preciso contar que esse escritor, quase nos matou de rir quando fomos buscá-lo no hotel para conhecer Londrina. Isso porque ele começou a falar um pouco dos seus livros: “Mulher: manual do proprietário” e “Homem: manual da proprietária”. Pra quem quer rir, sugiro a leitura. Assim como também sugiro a leitura da sua obra infanto-juvenil, em especial, “Sonhos, grilos e paixão” e “Semente de Sol” que são compostos de poemas para adolescentes, gênero tão em falta no país.

 

Ah! Tem também o escritor Renato Chagas que veio lançar seu livro O quinto set no calçadão de Londrina e que eu não pude participar, pois tive uma torção no nervo ciático e, em consequência disso fiquei de “molho” em casa. Ele, assim como Carlos Queiroz Telles, tem um grande senso de humor, conta uma piada atrás da outra e após o lançamento no calçadão, com direito a rede de voleibol e tudo, passou na minha casa para me fazer rir e relaxar das minhas dores.

 

O Almir Correia poeta paranaense com seus “Poemas Malandrinhos” até hoje agita grandes públicos. Digo até hoje, pois assisti a apresentação de um trabalho dele no 17o COLE (Congresso de Leitura do Brasil) em Campinas, onde em vez de um relato fez uma performance poética.

 

Bom, acho que devo parar por aqui, pois a vibração é minha e não do leitor, que fica limitado a imaginar os momentos que vivi. Outros autores estiveram presentes em projetos londrinenses de leitura, via SESC e Livraria Maluquinha, cito o Carlos Chá (que só sei notícias pelo site), o J.J.Veiga e o João Antonio (que também já não se encontram entre nós), o Roberto Gomes (que reativou sua editora em Curitiba), a Rose Sordi (moramos na mesma cidade, mas quase não nos encontramos), a Geni Guimarães (com seus olhos observadores), a Regina Coeli Rennó e o Rogério Borges (que ilustram e escrevem com muito primor), o Lukas (maringaense com suas charges afiadas), o Jota Marins (com seus hai kais), o Orlando Colli (médico que traz vidas) etc etc etc.

 

Quase não tenho fotos desses momentos, mas a memória como registro ainda provoca infinitas emoções.

 

Finalizo dizendo que ando num conflito danado: não sei se os meus textos estão narcisistas ou se com o avanço da idade estou cada vez mais querendo contar histórias.

 

Espero, no entanto que minha intenção seja percebida como estímulo a leitura das obras desses autores e me coloco a disposição para sugerir livros de cada desses escritores.


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SUELI BORTOLIN

Doutora e Mestre em Ciência da Informação pela UNESP/ Marília. Professora do Departamento de Ciências da Informação do CECA/UEL - Ex-Presidente e Ex-Secretária da ONG Mundoquelê.