BIBLIOTECA ESCOLAR - NOVA FASE


  • Discussões, debates e reflexões sobre aspectos gerais e específicos da Biblioteca Escolar. Continuação da coluna anterior, agora apenas com autoria de Marilucia Bernardi

ERA UMA VEZ UM LUGAR CHAMADO BIBLIOTECA – CAPÍTULO II

Como numa boa e gostosa história, resolvi puxar o fio da meada do texto anterior no qual cito tudo o que me leva a pensar em leitura, literatura e biblioteca, para mostrar o que significa ficar “plugado”, “antenado”, “ligado” em tudo o que nos levar à cultura.

 

É uma experiência e uma sensação deveras curiosa, engraçada até, eu diria, pois mesmo que você não tenha olhos de buscar, de um jeito ou de outro, os eventos ou atividades culturais acabam chegando até você. É uma questão de sintonia e isso extrapola o nosso mundo profissional, pois infere, diretamente, na área pessoal. Acabamos por estabelecer novos contatos, novas amizades; conhecemos a realidade por um prisma diferente do tradicional e cotidiano; enfim, nos inserimos no mundo.

 

Quero compartilhar algumas dessas experiências que tenho tido, desde o início do mês de setembro, que me valeram grandes descobertas, muitas lembranças, aprendizados, novas leituras e muitas idéias para trabalhar com nossos alunos.         

 

No dia 05 de setembro, antevéspera do feriado de setembro, ao acordarmos, meu marido me perguntou: “aonde iremos hoje”? Eu respondi que ele decidiria. E aí, sem pestanejar ele respondeu: “pois bem, então vamos conhecer o Sitio do Pica-Pau Amarelo, em Monteiro Lobato”. Como estávamos em São Bento do Sapucaí, era bastante próximo e rápido.

 

A estrada que dá acesso ao local já tem o nome significativo de Estrada do Livro, a 08 km do centro da cidade de Monteiro Lobato, uma pequena e aconchegante cidade do Vale do Paraíba, distante 132 km de São Paulo.

 

Ao chegarmos percebemos muita gente, pois como imaginávamos, por ser feriadão, encontraríamos mais pessoas com a mesma idéia nossa. A entrada é muito bonita, convidativa, com a visita monitorada. O Sítio está na Fazenda Buquira, outrora pertencente ao avô de Monteiro Lobato, o Visconde de Tremembé. O casarão foi construído em 1880, possui 18 cômodos compostos por bibliotecas e mobília do século passado. Lá, segundo especialistas em Lobato, foi a grande inspiração do escritor. Sua fase mais criativa foi durante o tempo em que lá morou e onde escreveu “Urupês”, “A velha praga” e o mais famoso, “Sítio do Pica-Pau Amarelo”. Pudera! O lugar é mágico!

 

Durante a visita, notei que a camiseta que algumas pessoas estavam usando tinha logos e desenhos curiosos e aquilo me chamou a atenção, então resolvi olhar mais de perto e perguntar. Qual não foi nossa surpresa ao tomarmos conhecimento que estávamos participando do último dia do I Festival de Literatura Infantil de Monteiro Lobato e ali mesmo, no Casarão, haveria um bate papo com 2 pesquisadores de Monteiro Lobato, vindos de São Paulo, mais o João Acaiabe, que por muito tempo “encarnou” o Tio Barnabé na série O Sítio do Pica-Pau Amarelo, na televisão, entre outras autoridades locais e demais convidados.

 

A minha alegria foi tão grande que me perguntaram se eu era professora infantil e por quem tínhamos sido convidados. O curioso da festa começa aí. Estávamos lá por puro acaso (se é que existe, não é mesmo). Contei-lhes que era bibliotecária e que trabalho, anualmente, com os alunos, a vida e as obras desse grande escritor. Resolvemos ficar para participar do encontro. Foi simplesmente fantástico, maravilhoso. Achava que conhecia Monteiro Lobato, mas percebi o quanto ainda falta e como conhecê-lo de formas diferentes. A direção da atividade ficou por conta de dois pesquisadores que trabalham com a Biblioteca Infantil Monteiro Lobato, aqui na capital, e que, curiosamente, foram convidados de última hora para participar desse festival. A escolha do local não poderia ser mais afinada. Tudo lá “cheirava” literatura, leitura, histórias, aves cantando, poesia... Eles apresentaram e leram algumas das cartas de Monteiro a amigos e família, quando de sua estada em São Paulo, para estudar, contidas nos tomos 1 e 2 de Cartas Escolhidas, da coleção Obras Completas de Monteiro Lobato.

 

Foi um deleite para os que tiveram essa rara oportunidade. Como não bastasse tudo isso, fomos convencidos a ficar para o almoço, já programado para os previamente convidados, e saborear a comida que Monteiro mais apreciava. Acabamos a visita no riacho de águas cristalinas, que fica no fundo do casarão, que o escritor batizou com o nome de Reino das Águas Claras.

 

Passamos horas a falar sobre o trabalho de leitura nas escolas; sobre como trabalhar Monteiro Lobato nos diferentes graus, não somente com o público infantil; trocamos e-mails, telefones e muita adrenalina.

 

E no meio disso tudo, entra outro fato curioso, ao mencionar onde eu trabalhava, uma professora que trabalha na Secretária de Cultura da cidade vira e me fala: “não acredito! Estive no seu colégio dias 21 e 22 últimos, participando do seminário sobre Educação Infantil...” Nada é por acaso mesmo...

 

Como a vontade de saber mais sobre Lobato era grande, no retorno ao trabalho, dia 08, tomei emprestado os tomos sobre as cartas e estou devorando-as. São deveras interessantes e, apesar de tanto tempo, são tão atuais.

 

Ainda inebriada por esse acontecimento tão intenso, iniciei a semana de 13 a 18 com a XXV Feira de Livros em nosso Colégio, trazendo vários autores para encontros com as séries. A atmosfera de literatura pairava sobre nós, pois por mais conhecidos que fossem alguns dos escritores, trouxeram muitas novidades e os que compareceram pela primeira vez, nos deixaram encantados, como foi com César Obeid, Alfredo Boulos Júnior e Luiz Donizete Grupioni.

 

Uma semana após, dia 25, estive na Sala São Paulo, num evento programado pelas Editoras Ática e Scipione, do Grupo Abril Educação. Outro maná literário ofertado com muito carinho, apreço e criatividade. Uma manhã deliciosa; num local tremendamente lindo e propício para o assunto em questão, que era sobre música e literatura, duas grandes artes.

 

O início foi uma aula show com José Wisnik ao piano, falando sobre música popular brasileira, aliada à literatura; depois foi a vez dos homenageados do dia, que receberam presentes da Editora: Marina Colasanti, Ricardo Azevedo, Moacyr Scliar, Rosana Rios e Tatiana Belinky. Para finalizar a manhã, o público presente foi agraciado com apresentações do Coro Infantil da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo e de músicos da Academia de Música da OSESP.

 

Para quem sabe aproveitar estes momentos tão preciosos, creio não ser preciso falar mais nada a respeito, os nomes e o contexto falam por si...

 

Só quero salientar que a grande maioria presente era de professores. Até onde minha colega Solange e eu percebemos, éramos as  únicas bibliotecárias. E, indagando ao colega divulgador, que foi o portador do convite, ele também falou que não conseguiu achar mais nenhuma bibliotecária mesmo, mas que havia convidado várias.

 

No dia 18 de outubro estive na Editora Cia das Letras, num lançamento do livro Metamorfoses: uma antologia de contos. A organização é de Heloisa Prieto, com contos de Ricardo Azevedo, Ana Miranda, Angela Lago e Heloisa Seixas.  Foi uma apresentação muito interessante, onde se discutiu sobre a Metamorfoses de Ovídio, texto que também aparece no livro, e ainda sobre as diferentes maneiras de ler textos literários.    

 

Lembrete: percebi que eu era á única bibliotecária...

 

Me tornando repetitiva sobre isso, ou seja, falar novamente sobre o bibliotecário não participar tanto quanto deveria ou poderia de eventos relacionados ao seu trabalho, ouso chamar a atenção para uma interessante matéria feita pela  Folha de São Paulo, do dia 20 de outubro sobre hábitos culturais das pessoas. O objetivo da pesquisa era mapear e compreender os hábitos culturais da população. E quanto a nós bibliotecários, vamos a museus? Vamos a exposições? Vamos a noites de autógrafos, lançamentos de livros, a cinemas, a teatros?

 

Lembrando de um trecho do livro Letramento funcional: função educativa do bibliotecário na escola, da Bernadete Santos Campello que diz: “Quando o bibliotecário desempenha apenas a função organizadora, atuando no sentido de organizar e disponibilizar a coleção da biblioteca, a necessidade de colaboração (do professor) é praticamente nula, mas aumenta se o bibliotecário atua na seleção e na aquisição dos materiais. Nesse caso, ele precisa ter conhecimento dos projetos e dos planos da escola para escolher e adquirir os materiais adequados. Para isso, precisa contar com a colaboração dos professores.

 

A colaboração se torna especialmente importante quando o bibliotecário desempenha funções diretamente ligadas à aprendizagem e desenvolve atividades com os estudantes. O tipo de colaboração depende do grau de intervenção do bibliotecário no processo de aprendizagem.”

 

O bibliotecário não deve se ater somente no conhecimento dos planos e projetos da escola e sim, do que se passa no entorno, ou seja, estar “antenado” culturalmente para poder oferecer tanto aos alunos como aos professores uma gama de possibilidades de trabalho e aprendizado. Essa leitura do mundo, que tanto Paulo Freire pregava, é que precisamos aprender mais e é no contato externo, nas visitas à outras bibliotecas;  nas idas às livrarias; nos encontros com autores; nas diversas atividades culturais promovidas em toda e qualquer cidade é que poderemos aprender e aproveitar este tipo de leitura, que alimentará, também, nossa vida pessoal.

 

E para terminar essa maratona cultural, neste texto, no dia 23 de outubro participei do II Encontro WMF Martins Fontes de Literatura Infantil e Juvenil – “Livros: modos de usar – a mediação da leitura na escola”. Existe tema mais propício para nós bibliotecários?

 

Nesse evento tive a grata satisfação de reencontrar 8 amigas bibliotecárias, porém, mais uma vez, o universo era dos professores. O programa não poderia ter sido melhor, em todos os aspectos: pontualidade, conteúdo, apresentação e os palestrantes sensacionais - José Nicolau Gregorin Filho, prof. da USP que falou sobre “Literatura para crianças e jovens – a formação de leitores literários”; a também professora e assessora pedagógica Maria José Nóbrega, com a palestra “Ler na escola – como identificar boas práticas com os gêneros literários” e o escritor Ilan Brenman, que nos divertiu muito com “Quem tem medo do lobo mau? – uma reflexão sobre o politicamente correto na educação e na literatura infantil e juvenil”.

 

Foi uma deliciosa manhã de sábado, num clima de muito humor e reflexão.

 

E, embalada nesse clima, emprestarei a frase impressa na pasta que recebemos:

 

“O tempo para ler, como o tempo para amar, dilata o tempo para viver.” Daniel Pennac


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MARILUCIA BERNARDI

Formada pela PUCCampinas. Atualmente elabora projetos para formação de Biblioteca Particular (Pessoal), oferece apoio a Bibliotecas Escolares e é aluna da Faculdade da Terceira Idade, da UNIVAP, em Campos do Jordão. Ministrou aulas de Literatura e Comunicação, por dois anos, na Faculdade da Terceira Idade. Atuou na Escola Estadual Prof. Theodoro Corrêa Cintra, em Campos do Jordão, pela ONG AMECampos do Jordão. Trabalhou na Fundação Getúlio Vargas de São Paulo; na Metal Leve; chefiou a Biblioteca da Faculdade Anhembi-Morumbi e foi encarregada da biblioteca do Colégio Santa Maria. Possui textos publicados e ministrou diversas palestras sobre Biblioteca Escolar.?