CINEMA


CORAÇÕES EM CONFLITO

Viagem do Coração e Nathalie X são dois bons filmes franceses em cartaz (pena que não em todas as cidades). Filmes para quem busca mais que simples diversão no cinema. Ambos estrelados por Gerard Depárdieu. Para completar: um é estrelado pela belíssima Isabelle Adjani, e o outro pela atraente e elegante Fanny Ardant. Em ambos: os conflitos do coração sejam pela paixão, sejam pelo amor, que se descobrem no sofrimento. Vamos aos filmes.

Em Viagem do Coração (2003) um ministro de estado (Depardieu) vive uma paixão por uma bela atriz francesa (Adjani), que o faz de bobo. Mas não só a ele e sim a todos os homens que dela se aproximam, e os controla através da paixão de cada um deles. Mas nenhum tão forte quanto ao personagem do escritor (Derangère) que assume o assassinato de um homem para livrá-la da prisão. A trama se passa no período de intervenção nazista na França, o que termina provocando desconforto para a atriz. Todos os homens a seus pés terminam por abandoná-la inconformados com a mentira em que se viram envolvidos.

A descoberta de que ela é a responsável pelo assassinato de um jornalista traz conseqüências que vão destruir suas paixões. Primeiro o jovem escritor, acusado e preso por um crime que não cometeu (mas acobertou pensando tratar-se de uma morte natural), e posteriormente o ministro, que pressionado pelo Gabinete termina por não poder mais protegê-la, terminam por abandoná-la. Tráfico de influência, espionagem e fuga da perseguição nazista compõem o clima das paixões (na verdadeira acepção do termo) que sustentam o argumento do filme.

Em Nathalie X (2003) um casal ao comemorar 25 anos descobre-se envolvido numa trama de traição. Na noite da comemoração das bodas de prata Bernard (Depardieu) não comparece a festa surpresa armada pela esposa Catherine (Ardant), para decepção de todos os amigos presentes e da bela Catherine. Como desculpa: a perda do vôo que o levaria da Áustria para a França. Mas a verdade não era esta e a esposa descobre em mensagens no celular que ele estava em um hotel com uma amante. A partir daí temos o desenvolvimento do filme.

Tratando-se de um casal francês, a questão toma um rumo inesperado. Embora bela e bem sucedida profissionalmente, Catherine defronta-se com o inverso do que pensava ser seu casamento: sólido e estabilizado. O seu mundo desmorona e ela após conversar com o marido sobre o assunto, e tendo a confirmação de que ele a traí, toma uma decisão inusitada: contratar uma prostituta para seduzi-lo e ficar sabendo das suas preferências sexuais.

Nathalie (Béart) é o codinome da moça contratada. Fazendo-se passar por uma estudante de literatura e tendo o ofício de tradutora como trabalho, a prostituta encontra-se regularmente com Catherine para informar-lhe dos encontros com seu marido. Nathalie conta à esposa traída, por exemplo, da forma agressiva como o seu marido disse que queria fazer sexo anal, ou do pedido que ele fez para gozar no seu rosto. Sobre o segundo pedido diz não ter aceitado imediatamente. Termina cedendo e gostando. E descreve a cena. O sexo no filme é implícito, não existem cenas, apenas as descrições, que são feitas de forma tímida e ritmada. E é aí que reside a atração do filme. Os diálogos dão a dimensão da cena sem precisarmos vê-las. Apenas as frases articuladas já incomodam a esposa traída.

Mas uma surpresa está reservada para os espectadores: a prostituta mente. Manipula a situação com a esposa do seu amante. Todos os relatórios dos seus encontros com Bernard não passam de mentiras. Bernard nem a conhecia. Ela nunca chegou a ter sequer um encontro com ele. Embora relatasse até a existência de um apartamento onde se encontravam.

Tanto em Viagem do coração quanto em Nathalie X, as mulheres que pregam as mentiras descobrem que quem planta mentira, semeia um fato inexistente e colherá a verdade indesejada. Quem mente, o faz para si mesmo, pois que para o outro é uma verdade que está sendo ouvida. E quando a verdade, ou melhor, a mentira vem à tona a pessoa (que mentiu) passa a ser vista de outra forma. Há que se considerar alguns contextos passionais para compreender o fato, mas por mais forte que seja o argumento não há justificativa que se sustente. E não há paixão que não seja questionada.

É nesse clima de paixões e mentiras, de amor e traição, que se passam os dois filmes. Vale a pena conferí-los.
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Viagem do coração. França, 2003. Direção de Jean-Paul Rappeneau. Com Isabelle Adjani, Gerard Depardieu, Gregori Derangère e Virginie Ledoyen.

Nathalie X. França, 2003. Direção de Anne Fontaine. Com Fanny Ardant, Gerard Depardieu e Emanuelle Béart.


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JUSTINO ALVES LIMA

Bibliotecário aposentado pela Universidade Federal de Sergipe. Graduado e mestre em Biblioteconomia pela Universidade Federal da Paraíba. Doutor em Ciência da Informação pela Universidade de São Paulo