CENSO ESCOLAR
Funcionários da Secretaria de Educação solicitaram o espaço da biblioteca da escola para o preenchimento de formulários do censo escolar.
Anualmente, o procedimento era o mesmo: os alunos eram chamados, individualmente, para confirmarem ou alterarem os dados existentes sobre eles nos arquivos da Prefeitura.
Esse trabalho permitia o levantamento de dados imprescindíveis para o planejamento de todas as atividades e a implantação de políticas no âmbito da educação no município.
A biblioteca era requisitada não só por ser um ambiente arejado e agradável, mas por contar com mesas de estudos e cadeiras em número suficiente para atender às necessidades dos pesquisadores.
Uma enorme fila formava-se na porta da biblioteca. Alguns alunos identificavam essa fila com a dos bancos - em especial as que serviam para pagamento da aposentadoria -, a do SUS e outras assemelhadas.
Três funcionários atendiam no espaço da biblioteca enquanto um outro organizava e controlava a fila e a entrada dos estudantes.
- O próximo.
Tacitamente, os funcionários decidiram que, para agilizar e otimizar a tarefa, o ideal seria perguntar item por item das informações constantes nas fichas e confrontá-los com as respostas dadas.
- O próximo.
Certa feita, um dos funcionários entregou a ficha correspondente a um aluno pedindo para que ele verificasse se algo estava errado ou havia mudado desde o censo anterior. Descobriu que essa sistemática era inviável, pois o aluno-cobaia, a exemplo da grande maioria dos seus colegas de escola, tinha muita dificuldade para ler e entender o que estava registrado nas fichas. O melhor era seguir o velho método - inventado por algum sábio funcionário público - de obter as respostas perguntando item por item.
- O próximo.
Naquele dia os trabalhos não estavam atrasados, mas por hábito ou por outro motivo qualquer, os funcionários continuavam com a mesma rapidez no atendimento. Quase não olhavam para os alunos, a não ser quando um deles gaguejava, demorava para responder ou fornecia uma resposta diferente da existente na ficha.
- O próximo.
O aluno entrou cabisbaixo, assustado. Seu medo era reflexo da forma como os dados eram colhidos e da austeridade que a bibliotecária impunha ao ambiente. Parecia uma prova. Pior: prova oral.
- O próximo - insistiu o funcionário, sem perceber que o aluno já estava em pé, ao lado da cadeira que lhe cabia naquele momento.
O funcionário fez um gesto com as mãos. A princípio, o aluno não entendeu, mas, em seguida, percebeu que era para que se sentasse.
Angustiado, o aluno esperava a primeira questão. Seria reprovado? Da fila, tentara aguçar os ouvidos na esperança de ouvir as questões que eram formuladas aos que o antecederam. No entanto, o barulho dos companheiros na fila não permitiu que ele entendesse algo do que se passava no "interrogatório". Os que saiam da biblioteca corriam, alegres, para o pátio, tentando utilizar o tempo extra que ainda teriam para brincar; só voltariam para a sala de aula após o último ter passado pelos pesquisadores. Correndo não ouviam ou não se importavam com as perguntas de alguns dos que estavam na fila.
Com vontade de ir ao banheiro, o menino respondeu, não sem exitar um pouco, à primeira: - Nome.
Dessa ele passara. Qual seria a próxima?
- Nome do pai!?
O menino, sem pensar muito, levou a ponta dos dedos à testa, depois à barriga, em seguida ao ombro esquerdo e ao ombro direito.
O funcionário levantou a cabeça quando o menino beijava a ponta dos dedos e dizia.
- Amém.
(Oswaldo F. de Almeida Júnior - relatando livremente um caso contado pela Izabel - recém formada em Biblioteconomia pela UEL)