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COINFO E SUAS DIMENSÕES EM TEMPOS DE POLARIZAÇÃO POLÍTICA

Simone Mª G. de O. Ulian

 

Aprofundar a discussão acerca do conceito de Competência em Informação não é o objetivo deste pequeno e despretensioso ensaio. Contudo, se faz necessário sua apresentação como ponto de partida para o desenvolvimento da ideia proposta no título.

Em linhas gerais, podemos afirmar que a CoInfo, sendo uma ação de interferência, é um conjunto de habilidades e competências que permitem ao indivíduo acessar, interpretar e utilizar a informação de forma crítica e consciente, é saber usar a informação para o conhecimento, é transformar o sujeito, por meio da informação, em protagonista social. Contudo, é importante destacar que a CoInfo não nasce espontaneamente no ser humano. A CoInfo se desenvolve mediante um processo de aprendizagem, mediante o processo da mediação da informação que, também, se configura como uma ação de interferência com o objetivo, mesmo que implícito, de desenvolvimento do protagonismo social.

Mas, o que é o protagonismo social? Muitos autores ligados à Ciência da Informação desenvolvem pesquisas sobre o tema – o que revela a importância do protagonista para o desenvolvimento da realidade material na qual o indivíduo está inserido – e, embora não haja um conceito único, o sentido do protagonismo social é unanime. Ser protagonista social significa compreender política e criticamente a realidade, e atuar nela visando a realização do bem comum, do coletivo, da justiça social e dos ideais da democracia, dos direitos humanos e da equidade. Ser protagonista é atuar visando o fim das mazelas sociais, das desigualdades, do desrespeito, da opressão e da exploração de uma classe sobre a outra.

Contudo, como já mencionado, a CoInfo não se desenvolve espontaneamente, e alguns autores, como Elizete Vitorino e Daniela Paintola, acreditam que a sua realização se dê mediante o alcance de dimensões sem as quais o protagonismo social nunca será obtido, sendo elas as dimensões técnica, estética, ética e política.

A dimensão técnica da CoInfo se traduz na capacidade de acesso, armazenamento e organização da informação, se traduz no domínio dos instrumentos utilizados desde a procura e acesso até a interpretação do conteúdo informacional disponibilizado. Quanto à dimensão estética, esta se relaciona à sensibilidade do sujeito, à sua intelectualidade, à capacidade sensível de compreensão da realidade. A dimensão ética, por sua vez, está ligada aos princípios basilares da construção da CoInfo, princípios estes que devem estar presentes orientando a ação. Já a dimensão política se caracteriza pela capacidade do sujeito em atuar ativamente na sociedade participando na construção coletiva de uma sociedade mais justa e igualitária, que visa o bem comum e o desenvolvimento humano.

Levando em consideração o exposto até aqui e observando a polarização política e ideológica que assola o Brasil nos dias atuais, é possível indagar em quais dos grupos antagônicos a CoInfo se desenvolve integralmente em suas dimensões propiciando a formação de protagonistas sociais. De um lado encontram-se aqueles que se intitulam progressistas, de esquerda e que defendem a democracia. De outro lado, estão aqueles que se autodenominam patriotas, que defendem um golpe de Estado, a destituição de um presidente eleito e a volta do Regime Militar, também, como uma forma de defesa do Estado Democrático de Direito.

Ambos os lados possuem fundamentos, éticos inclusive, que direcionam suas ações sendo que um deles chegou a efetivar atos que visavam a modificação de uma situação política já solidificada. Deram início a uma tentativa de revolução social e política no Brasil que aspirava deter a instauração de um governo ditatorial, bem como defender as ideias democráticos que incluem um processo eleitoral sem máculas e as liberdades inerentes a uma sociedade desenvolvida. De fato, é possível afirmar que tal grupo social alcançou a dimensão política da CoInfo e o consequente protagonismo social. Ou não.

Com um olhar mais atento às características e às dimensões da CoInfo, é possível perceber que, embora a sua dimensão política seja o ápice de seu desenvolvimento, não é a mais importante. Tem-se como articuladora das demais dimensões e do próprio protagonismo, a dimensão ética. Junte-se a isto o fato de ser a CoInfo, juntamente com a mediação da informação, uma ação de interferência, ou seja, o usuário da informação envolvido no processo não desenvolve por si só habilidades e competências próprias de um protagonista social. É necessário um processo educador que se dá por intermédio da informação mediada. A ética, no caso, não é responsabilidade do usuário, mas deve ser observada por quem realiza a interferência, ou seja, pelo mediador da informação. Daí a importância de um mediador da informação consciente.

No entanto, é válido ressaltar que não existe uma ética universal pois, se trata de um conceito socialmente construído, sendo que valores éticos que prevalecem em um grupo ou em uma determinada cultura ou sociedade, podem não ser válidos para outros grupos, culturas ou sociedades. Contudo, o que deve ser evitado no processo de mediação da informação é a manipulação porque a interferência é inerente a este processo mediacional. Mas, é possível determinar se os mediadores envolvidos nos atos que culminaram na tentativa de ruptura institucional realizada pelos patriotas manipularam as informações? Ou realmente acreditaram que assim agiam em prol da defesa do Estado Democrático de Direito?

Em um grupo organizado podem existir diversos níveis hierárquicos de comando pelos quais transitam as informações, sendo que os mediadores que compõem os níveis hierarquicamente superiores podem manipular deliberadamente as informações, seja por meio de técnicas de mediação da informação explícita ou implícita, de modo que aqueles mediadores integrantes dos níveis inferiores da hierarquia não tenham consciência de tal manipulação e perpetuam este processo de mediação até o usuário final que atuará como massa de manobra. A informação foi, de fato, por ele apropriada, houve a modificação ou a confirmação de conhecimentos e, embora a informação inicial possa ter sido manipulada por interesses escusos, o usuário final acredita fielmente que age em prol do bem comum e de uma sociedade mais justa e igualitária – e são esses os ideais que permeiam o protagonismo social.

Contudo, é possível incluir neste debate a teoria do poder desenvolvida por Max Weber, na qual este autor demonstra os tipos de líderes que exercem a dominação sobre um povo com a eficácia própria de cada um. Para ele, a dominação é mais eficiente que o exercício do poder já que este gera resistência. No exercício da dominação – que pode ser carismática, legal ou tradicional – o súdito se submete ao líder sem perceber a manipulação, a opressão e a exploração que o assolam.

Ainda, Henriette Gomes, em um de seus textos em que resgata a história de Antígona, afirma que o protagonista deve atuar como antagonista do poder imposto visando sua destituição e isto assusta o agressor. Desta forma, o agressor passa a se utilizar de estratégias informacionais – em caso do poder ser exercido pela dominação, caso contrário, a resposta do agressor se dará por meio do uso da força e da violência – buscando frear o desenvolvimento destes atores de ruptura do status quo, dando apenas a impressão de que os mesmos atuam, de fato, como protagonistas sociais. Desta forma, soltas estão as peças no tabuleiro do jogo onde estão em disputa a essência e a aparência das coisas.

Como mencionado no início, este texto trata-se de um pequeno e despretensioso ensaio, e não tem como objetivo encerrar o debate ou apresentar conclusões incontestáveis (se é que elas existem!). A intenção da autora reside em apresentar indagações e aspectos que a incomodam e que a impulsionam a pesquisar mais sobre o assunto e, quem sabe, despertar o interesse do leitor em aprofundar o estudo sobre os temas abordados de forma crítica e interdisciplinar.

 

Simone Mª G. de O. Ulian - simone.mgo.ulian@unesp.br; simonemaria@unir.br


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