ONLINE/OFFLINE


MANUSCRITOS ARMAZENADOS NO GENIZAH DAS ESTANTES: DICAS DE LEITURA PARA CATALOGADORES

O título acima é uma alusão ao capítulo 7 - "Perdidos nas estantes", do saboroso livro "A conturbada história das bibliotecas", de Matthew Battles (editora Planeta Brasil, 2003). O texto trata da origem e significado da palavra genizah (receptáculo), para designar um tipo de sepultura para o texto escrito descartado. Battles salienta que em sentido amplo o genizah simboliza uma biblioteca, ao armazenar livros e textos. A diferença está no aspecto da biblioteca, tradicionalmente, reunir materiais para uso futuro, enquanto o genizah armazena os documentos descartados ou estragados. Na biblioteca, os materiais estão sujeitos ao manuseio, transporte, perda ou roubo. Já o genizah, ao contrário, quando descoberto reaviva os documentos outrora descartados pelo valor que transmitem de sua época.

*

Baseado nesta simbologia, um paralelo com a situação de inúmeros textos acadêmicos de Biblioteconomia (dissertações e teses) que permanecem armazenados nas estantes das bibliotecas e no desconhecimento da maioria dos bibliotecários. Ainda que, na atualidade, tenhamos a Internet e as bases de dados e/ou biblioteca digital de teses, há muitos documentos não compulsados nos acervos bibliográficos e talvez desta maneira permaneçam, até serem descobertos como acontece com os textos jogados no genizah.

*

Neste sentido, são listadas algumas indicações para leitura de dissertações recentemente defendidas, que possibilitam ao bibliotecário, em especial, ao catalogador, uma atualização sobre o estado da arte de sua prática profissional. Principalmente, no que refere a temática da informática documentária, que aborda as mudanças e/ou tendências das nossas práticas e métodos de trabalho. Atualmente, os catalogadores transformam-se em verdadeiros gestores de bases de dados bibliográficas em unidades de informação. Desta forma, tais leituras são uma ótima fonte para o letramento do profissional que há muito vai deixando o ambiente das fichas impressas para preocupar-se com outros ambientes constituídos dos formatos, protocolos e interoperabilidade de sistemas.

*

Compartilho com os assíduos leitores desta coluna, alguns dos manuscritos depositados nas bibliotecas das instituições em que foram apresentados e defendidos por seus respectivos autores. Tais documentos encontram-se a disposição para serem consultados e revividos das prateleiras, iluminando olhos e idéias.

*

Para uma leitura panorâmica e conceitual, o trabalho "Informática documentária: estado da arte", elaborado pela bibliotecária Cristina Dotta Ortega. Dissertação de mestrado em Ciência da Comunicação, defendida na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo - USP, em 2002. A Pesquisa centra-se no tema da informática documentária, enquanto área que responde aplicação da informática e das telecomunicações às diversas fases de produção, tratamento, armazenamento, recuperação e disseminação das informações documentárias. Sistematiza aspectos teóricos e metodológicos, promovendo uma investigação terminológica e de conteúdo das vertentes encontradas sobre o termo no idioma inglês, espanhol e francês. Apresenta distinção entre automação dos serviços de biblioteca e informática documentária. Enfoca os aspectos históricos e conceituais que tentam explicar a delimitação entre os modelos terminológicos: francês e norte-americano. Texto claro e de fácil entendimento.

*

Após uma análise terminológica e conceitual, adentramos para o enfoque explícito da automação de bibliotecas. Neste assunto, há a pesquisa "XML na ciência da Informação: uma análise do MARC 21", de autoria do analista de sistemas Marcos Antonio Siqueira. Dissertação de mestrado em Ciência da Informação, defendida na Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista - UNESP/campus de Marília. Partindo da análise das formas de representação documentária descritiva que ocorre no processo de catalogação, elabora relação com as teorias de formas de representação estudadas pelas Ciências Cognitivas. Realiza estudo do formato de intercâmbio de dados bibliográficos - Machine Readable Cataloging (MARC 21), em sua versão Extensible Marrkup Language (XML), uma linguagem de marcação que prove mecanismos de comunicação de dados desenvolvida pela Ciência da Computação, o que caracteriza a dissertação como interdisciplinar. Apresenta a versão MARC 21 em XML como ferramenta adequada para representação documentária, promovendo reflexão sobre a necessidade de desenvolvimento de ferramentas de software e não só de novos métodos de representação. Além da abordagem teórica e metodológica de fundamentação da representação documentária, o estudo discute a questão da interface das ferramentas de softwares de otimização do processo da representação, que ocasionam dificuldades na elaboração de uma catalogação de qualidade, especialmente, no que se refere à descrição e intercâmbio de documentos eletrônicos disponíveis na Internet. Um texto técnico, didático na abordagem do MARC e do XML, de fácil leitura no geral.

*

Acompanhando a evolução dos formatos de representação em ambiente digital, o estudo "Metadados e formatos de metadados em sistemas de informação: caracterização e definição", desenvolvido pela Bibliotecária Márcia Rosetto. Dissertação de mestrado em Ciências da Comunicação, defendida na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo - USP, em 2003. Através de análise exploratório-descritiva, baseada em extensa literatura, constrói uma compreensão do significado e representação dos metadados e dos formatos de metadados nos sistemas de informação. Apresenta uma detalhada retrospectiva sobre os formatos de metadados. O trabalho contribui para maior divulgação do assunto de domínio recente no ambiente biblioteconômico brasileiro.

*

Na conclusão das indicações de leitura, uma abordagem sobre o tema: arquitetura da informação. Para tanto, há o trabalho da bibliotecária Fabiana Straioto, "A arquitetura da informação para a World Wide Web: um estudo exploratório". Dissertação de mestrado em Ciência da Informação, defendida na Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista - UNESP/Campus Marília, em 2002. O trabalho salienta que: a) o WWW - ferramenta da Internet, é uma fonte global de informações textuais, sonoras e imagéticas, com estrutura hipertextual; b) Para utilização das características desse ambiente (repositório e difusor de informação), é necessário que a massa de informações esteja organizada de maneira a possibilitar a perfeita recuperação e acesso, da parte do usuário. Desta forma, a pesquisa apresenta definições que orientam o entendimento a respeito da arquitetura da informação, por meio do estudo dos elementos que compõem a estrutura de um site e/ou portal, tais como: a organização das informações, rotulagem de navegação, busca, conteúdo da informação, usabilidade e tipos de documentos digitais. A dissertação é uma contribuição para os profissionais da informação que necessitem lidar com novos ambientes digitais. A leitura é simples e objetiva, ideal para iniciantes no assunto.

*

Indicação de boa leitura técnica para a comunidade bibliotecária, na minha opinião pessoal. Textos acadêmicos, depositados nos acervos bibliográficos, que pela baixa procura ou desconhecimento, acabam assemelhando-se aos documentos de um genizah. Desconhecidos da comunidade profissional, que em grande parte aguarda por um livro editado e comercializado em algum evento da área. Como estes, certamente, outros manuscritos existem e encontram-se arquivados, aguardando a descoberta da parte de pesquisadores, estudantes e profissionais de Biblioteconomia, em geral.


   666 Leituras


Saiba Mais





Próximo Ítem

author image
SOFTWARE LIVRE: ALFORRIA PARA AS BIBLIOTECAS
Novembro/2003

Ítem Anterior

author image
ARQUITETANDO A BIBLIOTECA DO SÉCULO XXI
Setembro/2003



author image
FERNANDO MODESTO

Bibliotecário e Mestre pela PUC-Campinas, Doutor em Comunicações pela ECA/USP e Professor do departamento de Biblioteconomia e Documentação da ECA/USP.