WILSON BUENO
Eu tinha pouco mais ou menos de 6 anos quando a família se mudou para Curitiba. O cordel O Pavão Misterioso que li, de uma enfiada, acho que com 7 anos, numa viagem de trem para o interior, é a mais antiga lembrança que possuo de alguma coisa mais que lida, decifrada por mim mesmo, e aquilo ficou sendo, para sempre, um delicioso segredo. Eu descobriria, com O Pavão Misterioso, a arte do segredo e, sem o saber, junto, eu descobria a literatura. Foi um arrebatamento a viagem dentro da viagem naquele trem. Estas viagens também estão muito presentes em minha memória, como um fato estético, digamos assim, e muito de meu Amarcord pessoal é pontuado pela delícia, o frisson e o mágico dessas travessias: as últimas marias-fumaças da Rede Viação Paraná-Santa Catarina, os campos fechados de capim-limão por onde o trem avançava furioso, acordando no vento um cheiro selvagem - e que, sem muito esforço, posso sentir de novo, agora, de um modo intenso -, os vagões-restaurantes de onde comíamos arrastados pela paisagem. (p.20)
Wilson Bueno - Escritor