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CULTURA PARA OS (JÁ) INCLUIDOS

A edição 2007 do Jazz Festival Internacional, patrocinado por uma empresa privada da área da telefonia, incluiu Aracaju no circuito do Festival. Uma novidade quando se pensa nos eventos nacionais de caráter internacional que acontecem nos grandes centros urbanos brasileiros, que são na verdade os centros gravitacionais do capital do país. Se a ótica do circuito é a do capital, então, nada mais concreto do que o roteiro contemplar as grandes capitais.

 

No entanto, é preciso que os eventos montados e exibidos em São Paulo e Rio de Janeiro, principalmente, de iniciativa de empresas privadas nacionais circulem pelo Brasil. Trata-se, evidente, de distribuir renda através de ação cultural, tendo em vista que determinado banco ou determinada empresa é nacional e não apenas paulista ou carioca.

 

As exposições e os eventos musicais circunscritos a tais metrópoles, frutos de investimentos financeiros subsidiados pelo governo federal, devem circular pelo Brasil, não como gentileza, mas como forma de retorno para os cidadãos que através do pagamento de impostos e consumo de produtos contribuem diretamente com o patrimônio das empresas. Tal ato contribuirá primeiro, para a democratização da cultura, e depois, para a inclusão cultural, tendo como premissa a abrangência do público e os procedimentos de acesso.  Fora o circuito de música patrocinado pela empresa brasileira de exploração de petróleo, não estamos afeitos a tais grandezas culturais.

 

Retome-se então o primeiro parágrafo, quando se aparenta legítima a circulação de eventos culturais nas grandes metrópoles, a ser considerada a importância capitalista. (E este é um país capitalista, e cada dia mais capitalista, confirmado pelos sucessivos e estratosféricos lucros dos banqueiros). Parece, para quem ainda acredita na cultura como força motriz de mudança, que a ótica capitalista não deve prevalecer, e que as empresas, que não fazem tais eventos fortuitamente, mas de forma pensada e equilibrada contabilmente em isenções fiscais, devem estender os eventos a outras cidades brasileiras, pois que são todas contribuintes para a formação do patrimônio de empresas privadas e públicas de âmbito nacional.

 

Pois bem, Aracaju foi incluída no roteiro nacional de um evento de porte considerável: o Jazz Festival Internacional 2007. Três dias de espetáculos com atrações internacionais, e inclusão de um grupo brasileiro, o All Star Jazz Band. E o que isso significou como proposta de “inclusão para todos”? Questão aqui levantada tomando-se como base o dito pelo mestre de cerimônias do evento, quando no segundo dia (sábado, 18), ao abrir o espetáculo e saudar os presentes, disse tratar-se de uma proposta de “cultura para todos”.  Some-se a isso a fala do bandleader da argentina Porteña Jazz Band, quando disse da sua satisfação de estar em uma cidade onde a cultura do jazz não era tão presente.  Ou seja, as falas indicam que a inclusão de cidades como Aracaju, que não tem poder financeiro para promoção de tal evento, tem como proposta um outro tipo de inclusão, que é a cultural.

 

Então, retomando a pergunta exposta no parágrafo anterior, o que significou como inclusão cultural em Aracaju? Infelizmente a resposta possível é: nada. Isto porque, a considerar-se o valor da entrada muita gente deixou de ir por não dispor do recurso. E o resultado? No primeiro dia um teatro esvaziado, que se reunido todo o público acomodar-se-ia na parte inferior, deixando totalmente desocupado o mezanino. No segundo dia um público bem maior, mas ainda com vazios no mezanino, e cadeiras desocupadas espaçadamente. (Não fui ao terceiro dia, portanto não sei como foi o público). Acrescente-se que no público dos dois dias citados estavam os convidados do projeto, a elite política e cultural sergipana, e os convidados desta elite, ou seja, um expressivo público não pagante; tendo-se a registrar a presença maciça de integrantes do poder executivo.

 

 Então onde ficou a inclusão cultural? Porque o Estado, grande beneficiário do espetáculo seja por ter o nome incluído em roteiro que lhe deu visibilidade artística nacional, seja porque os grandes custos estavam pagos pela patrocinadora oficial do evento, não disponibilizou os seus convites para alunos de escolas públicas e para funcionários públicos.  Não seria uma forma de inclusão colocar no espetáculo pessoas que normalmente não acessam tal tipo de cultura?

 

Porque as autoridades políticas e culturais não pagam os seus ingressos, sendo os convites destinados para a parcela que não pode pagar?  Por mais que se fale em inclusão cultural, tudo não passa de discurso, pois não existe um projeto político que pense na cultura enquanto permanência, mesmo sendo a partir de eventos.   E quando existem os eventos, a elite política e cultural, detentora dos cargos, disputa os convites para ter acesso gratuito como ganho indireto e demonstração de prestígio. E neste caso, é de bom alvitre que seja visto pelo seu superior, na rede política e cultural de chefes presentes ao espetáculo, como foi o caso do Jazz Festival.

 

É preciso que se transforme o discurso construído no tempo em prática presente. É preciso que se apresente uma política de cultura pela permanência. Há que se superar a agenda de eventos festivos, e se contemplar uma agenda de equipamentos culturais e eventos que culminem na introdução da permanência cultural. Tal política deve prever que espetáculos subsidiados por incentivos fiscais tenham preços reduzidos e que os convites sejam destinados a parcelas desfavorecidas culturalmente. Uma forma de inclusão cultural para confirmar a “cultura para todos”, anunciada no espetáculo.

 

Justino Alves Lima - Bibliotecário da Universidade Federal de Sergipe

Autor: Justino Alves Lima

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Seção Mantida por OSWALDO FRANCISCO DE ALMEIDA JÚNIOR

Professor associado do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Estadual de Londrina. Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UNESP/Marília. Doutor e Mestre em Ciência da Comunicação pela ECA/USP. Professor colaborador do Programa de Pós-Graduação da UFCA- Cariri - Mantenedor do Site.