PRÁTICA PROFISSIONAL E ÉTICA


  • A prática profissional e a ética voltadas para a área da Ciência da Informação.

PRÁTICA PROFISSIONAL E ÉTICA: DA UTILIDADE SOCIAL DO TRABALHO DO BIBLIOTECÁRIO

O século XVIII testemunhou na Europa a produção reflexiva de vários pensadores, transformada em obras ainda hoje fundamentais para sustentar o pensamento que tem predominância nos ambientes jurídicos, políticos e econômicos do Ocidente. Dentre esses filósofos, conta-se David Hume o celebrado difusor da precedência da ideia de utilidade nas ações morais da sociedade.

 

Hume é um autor cujas ideias liberais têm também contribuição seminal para o pensamento bibliotecário brasileiro, sintetizadas  no artigo 3º -  inciso “a”  do Código de Ética do CFB, transformado no texto de juramento dos bacharelandos dos Cursos de Biblioteconomia e recitado por ocasião dos atos de colação de grau dos candidatos ao exercício da profissão de bibliotecário.

 

Art. 3º:- Cumpre ao profissional de Biblioteconomia:

a) preservar o cunho liberal e humanista de sua profissão, fundamentado na liberdade da investigação científica e na dignidade da pessoa humana.

 

Nesta breve reflexão, me referirei em particular a um aspecto das ideias contidas em sua obra Uma investigação sobre os princípios da moral. Tomo como texto de estudo a edição de 1995, da Editora da Unicamp, cuja tradução foi realizada por José Oscar de Almeida Marques.

 

Após várias considerações, na seção ou capitulo V da obra, que intitula Por que a utilidade agrada, Hume afirma:

 

Parece ser uma questão de fato que o aspecto utilidade, em todos os assuntos, é uma fonte de louvor e aprovação; que essa utilidade é constantemente citada em todas as decisões morais relativas ao mérito ou demérito de ações; que ela é a única origem da alta consideração dedicada à justiça, fidelidade, honra, lealdade e castidade; que ela é inseparável de todas as demais virtudes sociais da humanidade, generosidade, caridade, afabilidade, leniência, misericórdia e moderação. E, numa palavra, que ela é o fundamento da parte principal da moral, que se refere à humanidade e aos nossos semelhantes. (p. 99).

 

Na coluna anterior, referente ao mês de dezembro de 2011, eu havia me referido à expectativa de que o ano de 2012 viesse a ser um ano melhor do que os anteriores para a categoria bibliotecária brasileira. Essa afirmação veio como decorrência de uma ação em desenvolvimento no sentido de se tornar viável a partilha de uma competência de gestão construída e aperfeiçoada pelo Conselho Federal de Biblioteconomia, ao longo dos últimos cinco a seis anos. Partilhar com quem? O CFB se propunha a examinar a possibilidade de partilhar com as demais entidades da mesma categoria profissional. Essas, sendo parte do mesmo universo, se organizaram ao longo dos últimos cinquenta anos para alcançar objetivos específicos, mas necessários ao desenvolvimento acadêmico e político da profissão, porém contando com recursos financeiros e materiais mais incertos e menos previsíveis que os auferidos pelo CFB.

 

Invoco aqui essa situação possível de ser efetivada por considerar os vários aspectos de utilidade a ela concernentes. Primeiro, por que emana de uma comunidade profissional cuja existência social se fundamenta em sua utilidade sem a percepção do qual ela própria não suportaria a sua permanência diante de várias incompreensões que uma sociedade predominantemente oralista tem a respeito da dinâmica histórica, estabelecida pelas várias tecnologias da escrita e da conservação dos seus meios. Segundo, pelo fato de que a existência do próprio CFB, da FEBAB, da ABECIN, da ANCIB e dos sindicatos de bibliotecários, entidades instituídas pela presença no país da categoria bibliotecária, apontavam para a utilidade das mesmas visando atender às condições de que esta categoria reafirmasse continuamente a sua utilidade para essa sociedade.

 

Nesse caso específico, a ação do CFB voltada para a transferência desse saber  ultrapassa os limites de generosidade e afabilidade para com as outras entidades; assim como a decisão dos seus conselheiros em torno de um repasse de conhecimento ultrapassa as relações pessoais com os membros dessas outras entidades, pois os resultados obteníveis com a realização de uma oficina de trabalho/estudo dessa natureza visa beneficiar a atuação de todos os membros da sociedade que, direta e indiretamente, demandam serviços de profissionais bibliotecários. Quem são esses membros da sociedade que usufruirão desse ganho? A meu ver: a) todos os professores de todos os níveis de ensino, que para o exercício de suas atividades profissionais não podem bem cumpri-las sem o atendimento especializado de bibliotecários; b) todos os estudantes de todos os níveis de ensino e no nível superior de todas as áreas acadêmicas, que para estudarem, aprenderem, criarem e inovarem não poderão prescindir da atuação especializada de bibliotecários; c) todos os políticos de todos os níveis legislativos, que para tomarem decisões justas e de utilidade social não poderão deixar de contar com o atendimento especializado de bibliotecários; d) todos os magistrados de todas as instâncias e áreas especializadas, que para emitirem seus julgamentos não poderão deixar de contar com o atendimento especializado de bibliotecários; e) todos os administradores públicos de todos os níveis de governo e de todos os setores estatais, que com o atendimento especializado de bibliotecários poderão exercitar melhor os seus encargos tão relevantes à felicidade social; f) todos os proprietários e gestores de todos os negócios privados de qualquer segmento e porte, que  com o atendimento especializado de bibliotecários poderão ampliar o sucesso e lucratividade de seus empreendimentos, gerando mais empregos, tributos e inovações em seus produtos; g) todos os cidadãos, que contando com o atendimento especializado de bibliotecários poderão exercitar melhor os seus deveres de cidadania e fiscalizar melhor os seus direitos humanos.

 

É, principalmente, por esperar que a realização dessa ação conjunta possa ser mais útil para a sociedade, que inicio o ano de 2012 com o sentimento de que mais conquistas poderão ser obtidas pelos profissionais bibliotecários brasileiros. Porém, esse caminho de resultados requer cada vez mais a explicitação  de questões pelo bibliotecário, como por exemplo: que utilidade social tem o trabalho que o bibliotecário faz? Quem tem a consciência disso?


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FRANCISCO DAS CHAGAS DE SOUZA

Docente nos Cursos: de Graduação em Biblioteconomia; Arquivologia; Mestrado e Doutorado em Ciência da Informação da UFSC; Coordenador do Grupo de Pesquisa: Informação, Tecnologia e Sociedade e do NIPEEB