ALGUMA COISA QUE ACONTECEU EM 25
O aluno, afobado, entra na biblioteca. Olha para um lado, para o outro e se dirige para a mesa da bibliotecária.
- Você trabalha aqui?
- Pois não?
- Aqui é a Biblioteca Pública, certo?
- É, sim. Posso lhe ajudar?
O menino não sabe se fica em pé ou se tira a mochila e se senta. A bibliotecária percebe o desajeito e diz que ele pode se sentar, caso queira. Já sentado, quase sussurrando, o aluno pergunta se a bibliotecária conhecia a professora dele.
- Conheço muitas professoras, mas nem mesmo sei em qual escola você estuda, fica difícil saber.
- Acho melhor você não saber. Ela é meio louca. Fala umas coisas que ninguém entende, ri de umas poesias que ela lê nas aulas, sei lá, essas coisas. Pede também que a gente escreva umas redações com temas estranhos. Tem só um aluno, puxa-sac..., quer dizer, um aluno que consegue fazer as redações. E o pior é que ele gosta.
Intuindo que aquela entrevista de referência seria longa e difícil, a bibliotecária se ajeita na cadeira, deixa de lado os materiais novos que entrarão para o acervo e que ela estava conhecendo, tira os óculos e aguarda. Como o menino não diz mais nada, ela se vê obrigada a retomar a conversa.
- Há pessoas que gostam muito de escrever. Outros preferem ler, outros...
- ... gostam de videogame - interferiu o menino.
- Também - concordou a bibliotecária. Mas, você não veio aqui pra falar mal da sua professora, não é mesmo?
Assustado, o garoto negou:
- Eu não estou falando mal da professora. Se ela souber, vou me ver com pobremas ... é... probremas, quer dizer, plobremas... Vê, ela fica insistindo pra que a gente fale a palavra certa que eu já nem sei mais qual a correta.
- Problemas. Essa é a forma correta. Você falando algumas vezes vai memorizar e não mais se esquecer.
- Você não vai contar pra ela, né?
A bibliotecária diz, rindo, que não sabe quem é ela.
- Afinal, o que é que você deseja?
O aluno começa a falar sobre uma guerra ou uma revolução, talvez a posse de um presidente ou, ainda, um autor, um ponto geográfico, quem sabe uma epidemia. Eram tantas as opções que a bibliotecária não conseguia entender nada.
- A única coisa que sei é que essa coisa aconteceu em 25 e começa com a letra "i" - diz o menino.
- 25? 1925, 1825, 1725, a que data isso se refere?
- Não tenho a mínima ideia. Acho que tem a ver com um país pegando uma parte do outro, porque está escrito "integra".
A bibliotecária, ainda confusa, confirma a possibilidade.
- Talvez alguma anexação. Seria o Acre? Ou um pedaço do México pelos EUA? Mas essas cosias aconteceram em algum ano terminado em 25?
Depois de várias consultas em obras de referência, desistindo, a bibliotecária interpele o aluno:
- Você não tem nenhum outro dado? Não tem nada no seu caderno?
O aluno abre a mochila, tira várias coisas dela - a ponto de encher a mesa da bibliotecária -, localiza o caderno, começa a folheá-lo, pra frente, pra trás até que depois de um bom tempo, mostra uma página em que constava "integra de 25". Estranho pensou ela. Resolveu olhar a página anterior. Nela constava: "Trabalho sobre a Revolução Constitucionalista". Fazendo um enorme esforço para não estrangular o aluno, ela diz:
- Você deve fazer um trabalho sobre a Revolução Constitucionalista e a data de "ENTREGA" é dia 25.
(Com base em caso contado pela Thaisi Lima)