ONLINE/OFFLINE


O AMBIENTE VIRTUAL DE DESCOBERTA COMPARTILHADA SHARE-VDE

Os atuais rumos da catalogação bibliográfica apresentam diversas bifurcações. São caminhos distintos, que em certos momentos se entrelaçam, em outros, seguem paralelos.

Apesar de a catalogação nascer de base comum, ao longo dos séculos aprimorou-se e expandiu. Entretanto, com o advento das tecnologias computacionais e digitais, o campo aflorou para uma variedade de possibilidades ou perspectivas de desenvolvimento no trato da informação.

Pode-se mencionar os padrões de catalogação e metadados que estão em período de significativas mudanças. Os dados vinculados têm sido incorporados aos principais padrões do campo.

Isso resulta na migração de dados bibliográficos em grande escala e com implicações relacionadas para os sistemas bibliotecários.

Várias bibliotecas se engajam nessa transformação, trabalhando em parceria com organizações de padronização, utilidades bibliográficas e outros colaboradores importantes. Aliás, vai se consolidado como tendência.

Essa transformação, promovida com dados vinculados (linked data), envolve o modelo BIBFRAME (Bibliographic Framework Initiative) e outros modelos. Esses dados são considerados o futuro padrão para tratamento dos recursos bibliográficos. Neste contexto, ganha evidência a iniciativa SVDE ou Share-VDE (Share Virtual Discovery Environment).

É uma iniciativa da comunidade para implementar e aproveitar o potencial dos dados vinculados, para oferecer uma experiência de pesquisa, aos usuários de biblioteca, com resultados abrangentes e detalhados. Reúne registros bibliográficos e de autoridade, produzidos pelos participantes. Consiste em uma plataforma virtual de descoberta baseada no modelo BIBFRAME.

Os registros bibliográficos gerados são convertidos de MARC para RDF (Resource Description Framework). A iniciativa utiliza o vocabulário BIBFRAME e outras ontologias para identificar as entidades bibliográficas.

Esse processo gera aglomerados de entidades como Pessoa, Obra, Expressão etc. Entretanto, ao contrário dos catálogos bibliográficos tradicionais, baseados apenas na descrição do registro, o Share-VDE se concentra nas entidades bibliográficas: Obra e Criador (Autor: Pessoa, Organização, Família). Veja no protótipo de pesquisa em: https://www.svde.org/.

A rede bibliográfica criada é publicada como dados vinculados na plataforma da iniciativa. Isso forma uma base de conhecimento codificada e acessível a todos os membros. Além da base Share-VDE e dos registros convertidos em dados vinculados, pode-se reutilizar os dados, conforme as necessidades.

A infraestrutura SVDE possui componentes tecnológicos implementados pela plataforma LOD (linked open data), desenvolvida e mantida por @Cult. Projetada para automatizar processos de criação e publicação de dados vinculados abertos, independente do formato da fonte de dados. Trata-se de um ambiente integrado e orientado à gestão de catálogos bibliográficos, arquivísticos e museológicos (LAM).

Ressalte-se que o LOD é uma tendência emergente no mundo “big data”, com impactos nos processos catalográficos. Ele facilita a liberdade de acesso e de reutilização da informação.

Mas, para essa finalidade, são necessárias ferramentas, aplicativos e plataformas que possibilitem publicar e consumir dados, inclusive os bibliográficos.

Neste sentido, a iniciativa apresenta uma interface de descoberta (Discovery) adaptada às ontologias de diferentes domínios. A conversão de registros em dados vinculados é escalável e configurável, conforme necessidades específicas.

O projeto do SVDE iniciou em outubro de 2016. Atualmente, implementa os processos de produção de registros e de procedimentos adicionais, conforme as prioridades determinadas pelos seus membros. Tem, entre os seus principais objetivos:

  • Enriquecer os registros MARC com URIs e as informações adicionais não expressas formato MARC;
  • Converter esses registros para RDF, com uso do vocabulário BIBFRAME (e outras ontologias);
  • Criar uma plataforma de descoberta, adaptada ao modelo BIBFRAME desenvolvido para fornecer dados vinculados;
  • Permitir resultados de pesquisa baseados em dados vinculados;
  • Implementar ferramentas de interação com os dados bibliográficos, permitindo aos bibliotecários editar, validar, atualizar e controlar os dados e as URIs de identificação das entidades;

A ideia contida no SVDE é o de ampliar a descoberta de recursos em catálogos bibliográficos. Aproveita o potencial dos dados vinculados para conectar informações bibliográficas com os usuários de biblioteca, em um ambiente dinâmico de pesquisa. Desta forma, permitindo importar e exportar dados, de maneira a liberar novas formas de acesso ao conhecimento.

O projeto expande-se para novos horizontes de cobertura, até pela necessidade de reunir instituições de um mesmo domínio de informação. O que resulta em ramos de iniciativas, como:

  • Share-Art: dedicada às bibliotecas de arte (catalogação de materiais visuais ou gráficos estão agrupadas neste ramo). Paralelo à iniciativa há o projeto Kubikat-LOD, uma plataforma de descoberta contendo os catálogos das bibliotecas de História da Arte do grupo Kubikat.
  • Share-Music: iniciativa ainda piloto de compartilhamento de registros musicais, e que envolve as bibliotecas: Bayerische Staatsbibliothek; Library of Congress; e da Stanford University.
  • Share-Catalogue: envolve uma rede italiana de bibliotecas universitárias que aplicam os princípios do modelo Share-VDE.  

Sob o ponto de vista técnico, a iniciativa permite uma gestão de dados eficiente. Em termos do serviço, reforça que os seus processos podem ser aplicados para outros grupos de domínios informacionais.

Em setembro de 2021, o Conselho Consultivo — Share-VDE Advisory Council, publicou uma declaração oficial descrevendo a função da iniciativa em contexto da Library Linked Open Data. Na oportunidade, destacou o fornecimento de dados abertos e o poder do BIBFRAME para um ambiente heterogêneo.

Também salientou, que a iniciativa tem reunido dados de bibliotecas Europeias e da América do Norte. Esses dados parametrizados no modelo BIBFRAME, são expandidos, via cooperação entre bibliotecas.

É, nesta perspectiva, que as agências contribuem com seus dados, tempo e recursos para o desenvolvimento do Share-VDE. É ressaltada dois apoios para o seu desenvolvimento. A parceria das utilidades bibliográficas italianas: Casalini Libri e @Cult.

A Casalini Libri é uma empresa que promove a difusão da cultura, por meio do desenvolvimento de serviços avançados para bibliotecas, instituições e editoras.

Já, a @Cult desenvolve sistemas integrados de bibliotecas, plataformas de acesso à informação e, em especial, serviços de autoridade, conversão e enriquecimento de dados.

O grande salto de expansão do Share-VDE foi ter sido selecionado pela LD4P3 (Linked Data for Production: Closing the Loop) para desenvolver o projeto PCC Data Pool.

O LD4P3 é um consórcio formado pela: Cornell University, Stanford University, e a University of Iowa's School of Library and Information Science, com o apoio da Fundação Andrew W. Mellon, para desenvolver um modelo de trabalho orientado ao ciclo completo de criação, compartilhamento e reutilização de metadados de bibliotecas.

No contexto do projeto Data Pool, o Share-VDE tem trabalhado com as agências: LD4P, OCLC e PCC, para reunir toda a catalogação BIBCO (Monographic Bibliographic Record Cooperative Program) e Conser (Cooperative Online Serials Program), produzida em MARC. Irá converter, enriquecer, reconciliar e armazenar os dados dessa catalogação, em uma infraestrutura de compartilhamento.

Os seus processos são aplicados para criar um conjunto aberto de dados BIBFRAME com qualidade PCC. Esse pool de dados estará disponível como uma fonte de dados confiável para bibliotecários de catalogação que criam dados nativos em BIBFRAME.

Todos esses procedimentos, devem contribuir para minimizar o antigo problema da duplicação dos registros em um catálogo baseado no MARC. Ao concentrar-se na obra original, em vez de instâncias específicas do recurso de uma biblioteca individual, essa abordagem vai além do enriquecimento de dados de uma ficha catalográfica, para uma nova maneira de abordar a descoberta dos registros bibliográficos.

Em síntese, para os processos de catalogação, o Share-VDE apresenta-se como uma plataforma BIBFRAME. Fornece dados bibliográficos que podem ser trocados com bibliotecas e outras plataformas BIBFRAME, como: RDA Registry, ISNI, DND Integrated Authority File, OCLC Worldcat Identities, VIAF, DATA.BNF.FR, Wikidata.

Para a operacionalização do ambiente, os grupos de trabalho do Share-VDE revisaram os detalhes e expandiram o modelo BIBFRAME para atender às necessidades do mundo real. Na figura 01, apresenta-se uma simplificação do modelo:

 

 

É do desenvolvimento deste modelo de dados que resultou o conceito Share-VDE Opus (um tipo de bf:Work). Ele agrupa as expressões relacionadas e a vincula à obra original. Desta forma, facilita a interoperabilidade com o modelo IFLA LRM. Saliente-se que para facilitar a leitura, os relacionamentos entre entidades são indicados apenas no primeiro exemplo à direita da figura. Para visualizar a imagem original acessar: http://bit.ly/SVDE_model_simplified. Para visualizar o identificador — ID 63931, para William Shakespeare; e o ID 10834, para a obra Hamlet.

Este cenário catalográfico configura-se em um ecossistema bibliográfico emergente. O modelo de dados e as ferramentas de desenvolvimento reforçam comunidade bibliotecária mais forte e cooperativa.

A iniciativa do Share-VDE é pela sua consistência, um projeto líder neste ecossistema. A possibilidade de reutilizar dados enriquecidos e estruturados, favorece a comunidade bibliotecária na prestação de serviços e produtos de informação que potencializam a pesquisa e o acesso social ao conhecimento.


   234 Leituras


Saiba Mais





Próximo Ítem

author image
PROTOCOLO Z39.83 PARA COMPARTILHAR MATERIAIS BIBLIOGRÁFICOS
Dezembro/2022

Ítem Anterior

author image
ESCOLA COM BIBLIOTECA E BIBLIOTECÁRIO É QUALIDADE NA EDUCAÇÃO: #SOUBIBLIOTECAESCOLAR
Outubro/2022



author image
FERNANDO MODESTO

Bibliotecário e Mestre pela PUC-Campinas, Doutor em Comunicações pela ECA/USP e Professor do departamento de Biblioteconomia e Documentação da ECA/USP.