A BIBLIOTECONOMIA EM MOVIMENTO
Havia dito no texto anterior, no qual introduzi esta coluna relatando um caso que aconteceu comigo, que os leitores poderiam enviar alguma história própria, contribuindo assim para este espaço. Recebi, de Marcos Paulo de PaSSos(1), este relato ocorrido em Marilia, em que é mostrado o que a força do movimento estudantil pode gerar. A insatisfação dos estudantes de Biblioteconomia e de Arquivologia, culminou numa união nunca vista antes nesta universidade, deixando perplexos com a sua ousadia, tanto os professores do Departamento de Ciência da Informação, como os estudantes de outros cursos. Rótulos discriminatórios como apáticos ou apolíticos, foram desconstruídos na medida em que o ato consolidou-se como marco de grandes conquistas.
Deixo aqui meu agradecimento ao Marcos, pelo envio do registro deste fato, no qual tantos outros estudantes participaram. Espero que este relato motive outras pessoas a enviar suas experiências como estudante e a participar ativamente do movimento estudantil de biblioteconomia. (
A BIBLIOTECONOMIA EM MOVIMENTO
No dia 05 de abril de 2005 na Unesp – Campus de Marília, os estudantes de Biblioteconomia e de Arquivologia, após decisão deliberada em Assembléia extraordinária reuniram-se em quase toda sua totalidade para realizar um ato de protesto
Dias antes, o Laboratório passava por um processo de reforma para atender uma necessidade do programa de pós-graduação
Se por um lado era perceptível a todos que não havia no campus outras salas ou ambientes tradicionais disponíveis para realização das atividades curriculares do recém instaurado Doutorado
Nesse cenário, a expressão de descontentamento dos estudantes trouxe como alegoria trajes rotos de cor preta, o panelaço (3), o cadeiraço (4) e o abandono das atividades discentes em vigência no decorrer daquela semana.
Outro ponto relevante aos estudantes para consecução do ato deveu-se, principalmente, pela forma como durante a reunião mensal do Departamento a questão foi tratada: além do modo ofensivo dirigido aos representantes discentes presentes e demais docentes que se punham contrários à decisão, a falta de uma discussão prévia ou mesmo uma previsão de remanejamento e alocamento dos equipamentos (obsoletos, precários ou em manutenção), utilizados pelos graduandos, acirrou os ânimos provocando ulteriormente a paralisação dos estudantes.
Comunicado os motivos da paralisação aos docentes presentes no dia inicial da manifestação (05/04/2005, data prevista para o início das atividades discentes do programa de pós-graduação
Diante desse panorama,
Na quarta feira (06/04/05) uma nova Assembléia realizada no Anfiteatro dessa faculdade, reunindo 130 estudantes de Biblioteconomia, ratificava as decisões deliberadas, desde que fosse realizada o mais rápido possível, uma reunião de proporções maiores com a participação de todos os estudantes da graduação e de todos os docentes do Departamento, a fim de se evitar maiores prejuízos quanto ao andamento das atividades curriculares e ainda, que fossem discutidos aspectos primordiais com relação ao Laboratório e o próprio andamento dos cursos.
Na quinta feira (07/04/05) a mesa composta por um representante discente na coordenação, a chefe do Departamento de Ciência da Informação, titulares do Conselho de
Nesta reunião foi decidido que a “ocupação” (5) permaneceria pelo menos até a vinda do reitor da Universidade ao campus de Marília (prevista para o dia seguinte, 08/04/05) na qual seria realizada uma Congregação Aberta, de modo que o ato trouxesse visibilidade a outras reivindicações do Campus de modo geral (nessa mesma semana os demais estudantes de outros cursos “ocupavam” a diretoria do campus). Para a visita anunciada, uma carta de interesse comum foi redigida por um grupo de estudantes e de docentes do Departamento para ser entregue ao Reitor.
Outra resolução, de caráter provisório, foi acordada entre docentes e discentes na qual foi decidido que o equipamento utilizado pelos estudantes de graduação seria alocado à sala 21 do prédio de Didática (Laboratório de Análise Documentária Paulo Tarcísio Mayrink) e a gestão desta, compartilhada pelos integrantes da gestão vigente do Centro Acadêmico de Biblioteconomia, a chapa “Jorge de Burgos” (Gestão de 2005).
Como resultado dessa semana histórica, a inédita participação de estudantes e docentes em discussões pontuais sobre a Universidade e, especialmente, sobre as especificidades e necessidades atreladas aos cursos de Biblioteconomia e de Arquivologia, estreitou as relações entre alunos e docentes bem como possibilitou o início de um diálogo direto, franco e aberto entre os envolvidos; vislumbrou ainda, que a integração de ambos os segmentos, possa promover em futuro breve - e que venha a ser habitual no Departamento de Ciência da Informação -, a discussão, reflexão e até mesmo a tomada de determinadas decisões em conjunto acerca dos rumos que norteiam nossas atividades acadêmicas, sejam estas relacionadas ao âmbito da formação curricular ou mesmo, durante o desenvolvimento e fortalecimento das pesquisas realizadas por esse grupo, entre outras atividades.
Ressalta-se ainda como conseqüência desses fatos, que essa promoção do debate e maior participação dos estudantes com relação a questões diretamente ligadas a sua formação, propiciou não só discutir as inquietações que acometem a todos no campus, mas também, refletidas nas reuniões mensais do Conselho de Curso e do Departamento de Ciência da Informação no transcorrer do ano de 2005 e de 2006, evidenciou que essa mútua colaboração visa entre outras coisas, angariar melhorias para o período de formação dos futuros profissionais da área e ainda, estabelecer uma relação mais próxima junto aos docentes desse departamento consolidando o espaço acadêmico como ambiente de reflexão e de pesquisa.
Frutos dessa parceria ficam explicitados na organização do VI EREBD SE/CO em 2005 no campus de Marília, cuja iniciativa partiu dos estudantes no ano anterior; nos relatórios de avaliação docente e discente dos cursos de Biblioteconomia e de Arquivologia realizados pelos docentes do Departamento e demais discentes representantes nos conselhos de curso e departamento em 2006, junto aos membros dos CABiblio e CAArq, bem como, a co-gestão do Laboratório de Análise Documentária (sala 21) pelos respectivos centros acadêmicos em anos subseqüentes (2005/2006), junto às docentes responsáveis
Se por um lado, a aquisição de equipamentos para esta sala redireciona nossas discussões para determinados aspectos, tais como, a presença cada vez mais forte de instituições privadas em locações destinadas ao ensino público e, em âmbito maior, a privatização do ensino superior público; também questões como o estabelecimento dessas parcerias devem ser consideradas pontos chaves para novas reflexões, debates e ações conjuntas entre discentes e docentes envolvidos na melhoria da formação estudantil com vista ao mercado profissional, ao desenvolvimento de pesquisas, ao crescimento da universidade e o retorno à sociedade desses benefícios.
(1) A forma ortográfica empregada para representação escrita do nome do autor, contravém com a regra geral da língua portuguesa para atender a um pedido particular, uma vez que, sua justificativa pertence a um projeto literário em curso. (No prelo, conforme afirmado em 2007).
(2) Bacharel
(3) Panelaço, do espanhol Cacerolazo uma manifestação espontânea de pessoas, realizando um chamamento político ou de organização. Sua principal característica consiste nos manifestantes mostrarem seu descontentamento, reunindo-se sem a necessidade de um lugar definido, batendo qualquer utensílio de forma compassada, originalmente panelas (cacerolas), surgindo daí seu nome. Ganhou visibilidade durante a crise econômica da Argentina, em
(4) Espécie de Panelaço adaptado, no Cadeiraço, cadeiras são retiradas de dentro das salas de aula e utilizadas para realização de um piquete, impedindo a entrada de alunos e professores.
(5) Refere-se à ocupação feita pelos alunos da Sala 22, que na época era o laboratório onde eles realizavam suas atividades, conforme explicitado no início do texto. Com a necessidade de reforma para o curso de Pós Graduação, os equipamentos foram transferidos por período provisório, para a sala 21, na qual permanece até os dias atuais. O laboratório de Análise Documentária, que estava alocado nesta sala, foi transferido para outro prédio recentemente construído.