ALÉM DAS BIBLIOTECAS


LIBERDADE SABOR DE ESPERANÇA

A palavra liberdade, junto com muitas outras, como amor, amizade, saudade, cidadania, fé, religiosidade, encerra um sentido muito amplo e, ao mesmo tempo, muito restrito. Parece que cada um de nós absorve um significado muito peculiar, a depender da visão de mundo que nutrimos e seguimos. Porém, no caso específico, estamos diante de uma palavra que vem se prostituindo ao longo dos anos, a partir do momento que a utilizamos para justificar atos vis, de naturezas distintas e em diferentes instâncias.

 

O político, no exercício do poder, desrespeita o cidadão “comum”. O professor lança mão da chamada liberdade de cátedra e se manifesta a favor de determinados grupos em detrimento de outros, incutindo nos jovens preconceitos e intolerância. O jornalista e qualquer indivíduo com acesso aos meios de comunicação se beneficiam da liberdade de imprensa para acusar, caluniar ou denegrir a imagem dos demais, o que vem se agravando com o anonimato permitido no espaço virtual e incentivado pela impunidade crescente.

 

Por meio da liberdade de linguagem, os artistas plásticos exercitam sua criatividade e transformam cadeiras acorrentadas em obras de arte; os escritores brincam com as palavras e criam textos que nos deixam voar; os circenses transformam tristeza em alegria. Há, ainda, a denominada liberdade de indiferença ou livre-arbítrio, quando o homem exerce seu poder de escolha sem outro motivo que não a própria possibilidade de exercer esse poder. É quando, ingenuamente, acreditamos que é possível jogar fora, de forma total e irreversível, os grilhões que nos algemam, às vezes, às normas impostas socialmente; outras vezes, às normas que nos impomos. Efetivamente, há muitas outras acepções, inclusive as privativas do universo jurídico, como liberdade provisória, liberdade sob palavra, liberdade vigiada.

 

Dentre tantos significados, o que mais nos encanta é a liberdade de pensamento, não a que designa o direito do indivíduo de externar opiniões e crenças, mas a que nos deixa livre para divagar e sonhar. É a liberdade de ir e vir. Pode até ser que esta idéia desperte risos. Pode até ser que alguém nos julgue ingênua. Mas, pode ser que alguém entenda nossa defesa em prol da liberdade de optar por uma realização de vida vivida. E, de verdade, cada vez mais, nos deparamos com gente disposta a ser feliz e fazer feliz os que lhe rodeiam. São pessoas especiais que são capazes de gestos simples: telefonar a um amigo, cedo ou tarde da noite, somente para lhe dizer quão bom é tê-lo nas horas de bonança e de tempestade; deixar a comodidade do “doce lar” para passar a tarde com um jovem paraplégico; ler um livro para crianças num jardim florido do orfanato de cor branca; ouvir por minutos e minutos a fala da viúva solitária...

 

Por tudo isto, creio que somos livres para ter a vida que optamos ter. Esta é a liberdade maior. E não podemos perder a esperança de que isto é possível. Não podemos nos intimidar com os risos de troça. Basta lembrar que se perdermos a esperança nos demais, inevitavelmente, perderemos a esperança em nós mesmos. Eis, assim, a liberdade como um sorvete de mil sabores – doces ou ácidos – mas que devemos nos dar ao luxo de saborear, por mais trabalhoso que pareça ser, e o é. Afinal, não seguir os rumos traçados por outros ou se postar na contramão dos rebanhos de homens-carneiros ou de mulheres-ovelhas nem sempre é fácil, mas creiam, é imensamente saboroso, mesmo quando menos doce ou mais ácido.


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MARIA DAS GRAÇAS TARGINO

Vivo em Teresina, mas nasci em João Pessoa num dia que se faz longínquo: 20 de abril de 1948. Bibliotecária, docente, pesquisadora, jornalista, tenho muitas e muitas paixões: ler, escrever, ministrar aulas, fazer tapeçaria, caminhar e viajar. Caminhar e viajar me dão a dimensão de que não se pode parar enquanto ainda há vida! Mas há outras paixões: meus filhos, meus netos, meus poucos mas verdadeiros amigos. Ao longo da vida, fui feliz e infeliz. Sorri e chorei. Mas, sobretudo, vivi. Afinal, estou sempre lendo ou escrevendo alguma coisa. São nas palavras que escrevo que encontro a coragem para enfrentar as minhas inquietudes e os meus sonhos...Meus dois últimos livros de crônica: “Palavra de honra: palavra de graça”; “Ideias em retalhos: sem rodeios nem atalhos.”