MEDIAÇÃO DA INFORMAÇÃO


  • Reflexões sobre a Mediação da Informação, englobando aspectos teóricos e práticos.

ACADEMIA E MERCADO DE TRABALHO: PARA QUEM É VOLTADA A PRODUÇÃO CIENTÍFICA?

Há alguns anos, constatei – na base do empírico, embora o fato de eu ser editor de algumas revistas e publicações tenha permitido ampliar o campo de análise – que poucos são os que leem os artigos publicados nas revistas especializadas da área. Estou me referindo à Ciência da Informação, mas essa constatação pode ser ampliada para a maioria das áreas do conhecimento humano.

 

Em média, não mais do que 20 pessoas têm contato, se interessam, acessam e leem um determinado artigo. Esse número pode ser alterado se o artigo for utilizado como literatura básica em alguma disciplina de cursos de graduação ou pós-graduação ou se, e esse é o caso de poucos, for entendido e disseminado como um texto clássico, de leitura quase obrigatória.

 

As revistas de acesso online (uso o termo acesso online e não revistas eletrônicas, pois as que existem hoje nada mais são do que uma transposição da forma em papel para o meio eletrônico, sem grandes alterações) melhoraram, com certeza, o acesso aos textos, mas acredito que não ampliaram muito a quantidade de leitores.

 

Conversei com vários profissionais, antes da possibilidade do acesso eletrônico, e todos me diziam a mesma coisa: vejo o sumário das revistas que assino (ou que tenho acesso nas bibliotecas da área) e escolho alguns artigos. Há vezes em que não se elege nenhum dos artigos, em especial porque tratam de segmentos da área que não são de interesse.

 

A tendência, após o término do curso de graduação e a entrada no mercado de trabalho, é nos especializarmos em um determinado segmento relacionado ao que nos simpatizou e atraiu nossa atenção e interesse durante o curso ou relacionado ao tipo de trabalho que desenvolvemos em nossa atividade profissional.

 

Dos artigos escolhidos analisa-se o resumo. Se o interesse continuar, dá-se uma rápida olhada no conteúdo, incluindo a bibliografia. Em boa parte das vezes, nada ou pouco sobra dos textos pré-escolhidos.

 

O público dos artigos passa a ser os alunos e os pesquisadores.

 

Os profissionais, os que estão atuando no mercado, acabam tendo pouco interesse pelos artigos publicados nas revistas especializadas, em especial por dois motivos: estão escritos em linguagem acadêmica e norteados para o público acadêmico.

 

Elaborar um texto dentro da rigidez acadêmica, atendendo às normas das revistas – que tendem a ser mais e mais exigentes –, interrompendo inúmeras vezes a pesquisa desenvolvida – quase sempre apenas para responder ao que as instâncias avaliadoras da academia obrigam – e ser lido por um diminuto público? É isso que os pesquisadores desejam?

 

Além de tudo isso, o retorno sobre o que se escreve é quase nulo. Sabemos da leitura e do interesse das pessoas quando nosso artigo é citado ou incluído em bibliografias. Raros são os que nos procuram para conversar ou discutir sobre ideias que veiculamos nos textos publicados. E estou usando a primeira pessoa do plural pois essa é uma situação comum a todos os que publicam textos em revistas especializadas.

 

Escrevendo para publicações vinculadas a Associações, Conselhos, Sindicatos, Centros Acadêmicos ou entidades que objetivam atuar voltadas para os profissionais, descobri que os textos atingem um público muito maior e têm uma influência direta no fazer dos que estão atuando no mercado. O público delas é diferenciado e a linguagem dos textos não precisa atender aos ditames da academia. O retorno também é muito maior.

 

Tive várias experiências desse tipo. Delas, uma foi especial: a revista Palavra Chave. Publicada pela Associação Paulista de Bibliotecários, tinha números temáticos, com artigos de autores convidados. Os textos – e a revista como um todo, pois havia espaços dedicados a experiências com leitura, charges, etc. – eram voltados para os profissionais que atuavam no mercado de trabalho bibliotecário. Os sócios recebiam a revista gratuitamente. A recepção foi muito boa, embora a dificuldade em manter a revista – os custos eram altos – não permitia uma adequada periodicidade.

 

A leitura dos textos veiculados na Palavra Chave era em maior quantidade do que os publicados nas revistas especializadas da época, voltadas para a academia. A RBBD – Revista Brasileira de Biblioteconomia e Documentação –, publicada pela FEBAB, em seu início, mesclava artigos acadêmicos com notícias, informações e textos dirigidos aos profissionais.

 

Quando pensei em criar em meu site – este site – um espaço para artigos sob responsabilidade de autores fixos, o fiz objetivando atingir mais os profissionais. Esse público é mais carente de discussões, debates e reflexões; não está vinculado à academia (embora cada vez mais procure cursos de especialização, atualização, reciclagem, etc., o que demonstra um interesse em se aperfeiçoar também no âmbito teórico) e que atua normalmente sozinho, isolado. A falta de interlocutores, ou a dificuldade de contatá-los, por falta de tempo ou impossibilidade de participar de eventos, cursos ou outras formas de contato, leva boa parte dos profissionais a ter problemas para conhecer o que há de novo na área, quais as ideias que estão surgindo, os caminhos e tendências da área.

 

Particularmente, elegi esse público também como meu foco de interesse. Academia e mercado devem buscar proximidade; um é dependente do outro. Acho que há um fosso entre a academia e o mercado, entre os pesquisadores e os profissionais. Uma ponte deve ser feita, mas não somente dentro dos moldes (autoritários) da academia: um linguajar específico, uma estrutura restritiva, a eleição de determinados temas como prioritários, a forma como devem ser pensados, o formalismo das metodologias, essas coisas. Não sou contra, óbvio, até porque vivo nesse ambiente, mas creio que é preciso criar formas para que a academia consiga disseminar suas discussões e reflexões para os que atuam nos vários segmentos do conhecimento humano. Sem exigir que esses profissionais se submetam, incondicionalmente, às suas determinações. A academia faz uma distinção entre conhecimento e saber, entre conhecimento científico e senso comum de maneira discriminatória (lógico que existe diferença, mas não dentro de uma hierarquia de valores que tem as classes sociais como pressuposto). No âmbito da produção científica, as publicações que divulgam determinados conteúdos e não possuem um vínculo com instituições reconhecidamente de pesquisa ou de formação de uma área, ou mesmo texto que se valem de uma linguagem menos acadêmica, tem seus textos rotuladas de “vulgarização científica”. A palavra “vulgarização” denota o que está por trás de seu uso.

 

Os profissionais que atuam no mercado também devem contribuir para a ponte que busca eliminar ou amenizar o fosso com a academia: não podem se aferrar à ideia de que a prática, de que o fazer são mais importantes que a teoria; não podem esquecer da importância da teoria, melhor dizendo, das bases teóricas que dão sustentação ao seu trabalho, às suas atividades, às suas ações. Nenhum fazer é dissociado da teoria, como nenhuma teoria pode se separar do real.

 

No site Infohome os textos são mais curtos e a linguagem é livre. A proposta é se adequar à linguagem do espaço virtual, mas não significa que se esteja vulgarizando conteúdos da Biblioteconomia ou da Ciência da Informação. Ao contrário, estamos tentando possibilitar que a as teorias se encontrem com as práticas.

 

Este texto, provavelmente, não seria aceito em uma revista entendida como científica, pois é curto (meras 4 ou 5 páginas), não possui uma linguagem entendida como acadêmica, não possui citações, referências, sustentação teórica exteriorizada. Mas, espero, possa atingir um público não só de acadêmicos, como de profissionais.


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OSWALDO FRANCISCO DE ALMEIDA JÚNIOR

Professor associado do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Estadual de Londrina. Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UNESP/Marília. Doutor e Mestre em Ciência da Comunicação pela ECA/USP. Professor colaborador do Programa de Pós-Graduação da UFCA- Cariri - Mantenedor do Site.