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QUALIDADES BÁSICAS PARA O BIBLIOTECÁRIO DE CATALOGAÇÃO

O trabalho de um bibliotecário de catalogação pode diferir de uma biblioteca para outra. Até pelas necessidades específicas de controle bibliográfico aplicado pela gestão do setor de tratamento técnico. Porém, as responsabilidades deste profissional, tradicionalmente, envolvem a preparação de registros para representar os itens. Além de fornecer as condições de acesso e recuperação pelo público usuário, através do catálogo.

No processo da catalogação bibliográfica, levanta-se uma questão: Quais são as qualidades básicas para que um bibliotecário seja exitoso na atividade? Neste sentido, o texto: Ten Essential Qualities for Success: A New Cataloging Librarian’s Guide from a Supervisor’s Perspective, sugere 10 qualidades, consideradas significativas para um bom desempenho na atividade da catalogação. Especialmente, em tempos de inovações normativas e conceituais dos processos catalográficos.

Quanto as qualidades, essas envolvem: competência; precisão; eficiência; consistência; adaptação; discernimento; resolução de problemas; compromisso; habilidade de pesquisa e autodisciplina. Com base no texto citado, elabora-se uma breve resenha, com alguma reflexão sobre as qualidades básicas para o bibliotecário de catalogação, sem, entretanto, detalhar todos os aspectos envolvidos.

Competência:

Para o bom desempenho na catalogação, conhecimento é essencial. O conhecimento inclui a formação teórica e técnicas para apropriação e uso dos ferramentais catalográficos. Basicamente, envolvem:

 

  • Conferência Internacional sobre Princípios de Catalogação, Paris 1961 e Princípios Internacionais de Catalogação (PIC);
  • Requisitos Funcionais para Registros Bibliográficos (FRBR);
  • Requisitos Funcionais para Dados de Autoridade (FRAD);
  • Requisitos Funcionais para Dados de Autoridade de Assuntos (FRSAD);
  • IFLA Library Reference Model;
  • Código de Catalogação Anglo-Americano, segunda edição (AACR2);
  • Descrição Bibliográfica Normalizada Internacional – consolidada (ISBD) e/ou Recursos: Descrição e Acesso (RDA);
  • MARC 21 Formato para Dados Bibliográficos e Dados de Autoridades;
  • Esquema de descrição de objetos de metadados (MODS);
  • Dublin Core Metadata Elements;
  • Classificação Decimal de Dewey (CDD);
  • Classificação Decimal Universal (CDU);
  • Tabela de Classificação da  Library of Congress (LCC);
  • Colon Classification;
  • Cabeçalho de Assunto da Library of Congress (LCSH);
  • Library of Congress – Program for Cooperative Cataloging Policy Statements (LC-PCC PSs);
  • Library of Congress Name Authorities.

Porém, ao bibliotecário de catalogação não compete apenas conhecer e saber fazer uso das ferramentas. Ele necessita manter-se atualizado sobre as mudanças e atualizações ocorridas. Normativas e recursos catalográficos se alteram para acomodar novos conteúdos e demandas informacionais. A leitura técnica e a reciclagem profissional permitem sintonizar-se com as atualizações. Outra atenção, relacionada à catalogação, é compreender as funções do sistema integrado da biblioteca. Envolve entender as relações entre módulos como: seleção e aquisição, catalogação, controle de seriados, circulação de publicações, e a interface de consulta do catálogo de acesso público online (OPAC). O software contempla ou deve contemplar procedimentos que envolvem a criação de dados úteis para os usuários do catálogo. Compreender a função do módulo de catalogação em todos os seus aspectos é requisito essencial. Por exemplo, responder perguntas do tipo: o módulo catalográfico fornece eficiente controle de autoridade? Permite detalhar o registro do acervo e o seu status? Possibilita indexar quaisquer campos bibliográficos? Outra habilidade, significativa, é saber o que é e como usar uma utilidade bibliográfica. Atualmente, entender a relação entre AACR2/RDA e a codificação em formato MARC é necessário para criar registros sob novos princípios e para intercâmbio ou cooperação bibliográfica. Também, estar familiarizado com critérios para deliberar sobre a importação de registros, evitar duplicidade de dados e potencializar os esforços humanos envolvidos.

Precisão:

Apesar dos mecanismos de busca da Internet, consultar o catálogo ainda tem a sua importância. A precisão da descrição dos itens e a definição dos seus pontos de acesso, nos registros, é importante para uma recuperação eficiente dos dados e tomada de decisão por parte dos usuários. Os novos princípios internacionais da catalogação revalorizam a tarefa do usuário, no uso do catálogo. Entretanto, erros de digitação e de codificação MARC, ou falta de formato na estrutura, ou padrão dos registros afetam os resultados da consulta. Os erros podem impactar os serviços bibliográficos, como o empréstimo ou de localização dos itens. As imprecisões bibliográficas geram sobrecarga de trabalho para a equipe. Toda correção de dados tem alto custo para a biblioteca, assim deve ser evitada por meio de um trabalho correto, feito da primeira vez. Ademais, correções prejudicam o público pela indisponibilidade do item.

Eficiência:

Nenhuma biblioteca, seja pública, escolar, universitária ou especializada, tem orçamento ilimitado, ao contrário, algumas nem dispõem de um. Em geral, são organizações sem fins lucrativos, com pouca alternativa para gerar receitas próprias. Assim, a obrigação é gastar os recursos de forma eficiente, da mesma forma, estabelecer uma boa relação custo-benefício, na catalogação. Situação que obriga, o bibliotecário, a adotar um forte senso de economia nos processos e a fornecer registros de qualidade e a baixo custo. Para aumentar a eficiência e controlar os fatores que possam afetar esse objetivo, a escolha do método de criação é importante. Atualmente, economizar com a catalogação é possível ao utilizar dados de uma utilidade bibliográfica ou participar em uma rede de cooperação, ou ainda, copiar de catálogo online. Desaconselha-se editar registros em papel para posterior digitação, pelo alto custo e ineficiência envolvidos. Os procedimentos realizados na atividade afetam a eficiência catalográfica, portanto, a atividade deve se beneficiar da catalogação cooperativa, algo defendido por Charles Coffin Jewett, em meados do século 19. Eliminar etapas redundantes ou desnecessárias, ajuda o processo representativo a entregar, em tempo hábil, os materiais aos usuários. Desenvolver habilidades de gestão de tempo e de organização da catalogação. Pois, além da carga normal de trabalho descritivo, o bibliotecário deve lidar com outros projetos bibliográficos decorrentes. Isso inclui reclassificação, manutenção de dados e eliminação de pendências, adotar metadados de preservação ou de repositório, implementar novas normativas e princípios catalográficos. Para concluir tais projetos, dentro do prazo, a gestão eficaz das atribuições e das horas de dedicação, baseadas na prioridade, é atitude adequada.

Consistência:

É fator chave na organização do acervo. As normas e padrões bibliográficos devem ser aplicados de forma consistente para fornecer um nível de qualidade da catalogação. A classificação e indexação de assuntos precisam ser atribuídos considerando a coleção como um todo para fornecer e manter a consistência e uniformidade temática da biblioteca. A padronização das descrições e a indicação das entradas autorizadas também devem ser consistentes, tanto quanto possível, para aumentar o compartilhamento dos dados bibliográficos e de autoridade. Quando as normas, ferramentas e padrões não acomodarem todas as necessidades, de uma comunidade específica de usuários, o bibliotecário precisa estabelecer políticas ou práticas institucionais. Essas políticas e práticas precisam ser bem documentadas para a operacionalidade da coleção, nos processos atuais e, mesmo, para ajuste aos processos futuros. A consistência decorre da mentalidade lógica do bibliotecário. Cultivar e aprimorar a essa mentalidade é necessária para preservar a integridade e a organização do acervo.

Adaptação:

O mundo bibliotecário encontra-se em transformação, afetado por tecnologias que mudam os processos de trabalho e, consequentemente, as normativas. Neste cenário, bibliotecas implementam recentes sistemas eletrônicos ou, simplesmente, atualizam os existentes. Os atuais sistemas requerem aprimoramentos e alterações do fluxo de trabalho e de suas deliberações. O profissional precisa ser flexível o suficiente para desaprender os métodos antigos e aprender os novos. Flexibilidade suficiente para adotar procedimentos que melhorem a produtividade catalográfica. Como os procedimentos, as políticas de catalogação devem ser revistas e ajustadas para refletir as novas ofertas de serviço aos usuários. Saliente-se que os formatos dos materiais bibliográficos mudam de acordo com tecnologias e as demandas da comunidade usuária, além das alterações demográficas e recursos orçamentários, se existentes. Toda mudança afeta o processo e a carga de atividades do bibliotecário de catalogação. Compreender essas mudanças ajudam na sua adaptação.

Discernimento:

Julgamento ou tomada de decisão são atributos valorizados, atualmente, no perfil do bibliotecário de catalogação. Afinal, atribuir assuntos, classificações, regras e codificar em MARC, ou em outros padrões de metadados apresentam problemas que geram incerteza e ambiguidade ao processo bibliográfico. Essas questões não são de fácil resolução, pois requerem domínios teóricos e técnicos, além de bom senso. Na catalogação, há interpretações no ajuste dos conteúdos, dentro do escopo da representação temática e descritiva. O AACR2 e o MARC foram estabelecidos há muito tempo, quando não tínhamos materiais digitais de distribuição online. Embora tenham sido revisados, eles não cobrem todos os cenários possíveis, aliás o AACR2 foi descontinuado em favor da RDA e o MARC se pretende substituído pelo BIBFRAME. Sob todos os aspectos, o julgamento do bibliotecário é necessário quando “em caso de dúvida” ou “se apropriado” uma situação é apresentada diante das regras e padrões catalográficos. O profissional necessita sentir-se confortável em tomar decisões ao lidar com as áreas cinzentas das interpretações normativas. É preciso julgar com base em raciocínio lógico e princípios catalográficos. Entretanto, existem listas de discussão eletrônica, fontes digitais e bibliográficas que fornecem auxílio para o julgamento do catalogador, por exemplo:

Resolução de Problema:

Ao implementar padrões catalográficos, o bibliotecário depara-se com problemas de praticidade ou que causam dificuldades, na experiência dos usuários, com o uso dos sistemas da biblioteca. As ferramentas estão em evolução e, portanto, apresentam atualizações contínuas que afetam a interação das pessoas com a interface bibliográfica. O profissional tem que decidir como e quanto implementar essas atualizações. Também, deve estar consciente ao deliberar sobre a qualidade, consistência e flexibilidade dos registros. Aprimorar a habilidade na resolução de problemas, baseadas em raciocínio lógico, é necessária para resolver desde as pequenas até as grandes questões envolvidas na aplicação descritiva. Ele precisa visualizar todo o contexto de uma coleção para encontrar soluções rápidas ou de longo prazo; soluções realistas, de fácil implementação e, principalmente, conveniente ao público. Se a biblioteca faz parte de um consórcio ou de uma cooperativa, as políticas e as regras catalográficas, deste condomínio bibliográfico, devem ser consideradas nas resoluções. Também, as exceções às regras podem ser consideradas em favor da conveniência do público. Uma vez tomada a decisão é importante segui-las. Da mesma forma, é importante ter coragem profissional para realizar correções ou alterações de rumo, em caso de equívocos nas decisões tomadas.

Compromisso:

Para alta direção da biblioteca, em geral, espera-se um bibliotecário de catalogação que supere desafios e expectativas. Que esteja disposto a encontrar soluções aos problemas de representação. Que possua forte senso de responsabilidade com o seu desempenho e dedique esforços para ser reconhecido, pela excelência do seu trabalho, além da satisfação pessoal. O profissional deve revisar, sistematicamente, a descrição das suas atribuições e dos requisitos técnicos aplicados no aprimoramento das suas habilidades. Desenvolver maneiras de processar uma representação produtiva na promoção da coleção e do atendimento as demandas do público. Neste aspecto, ele precisa ter entendimento dos procedimentos, políticas e práticas catalográficas, para fornecer estrutura bibliográfica consistente aos recursos informacionais, no que refere o seu uso presente e futuro. Também, o compromisso de lembrar dos procedimentos, políticas e práticas catalográficas até estarem assimiladas e refletidas na própria qualidade da catalogação.

Habilidade de Pesquisa:

O crescimento e o desenvolvimento da profissão bibliotecária dependem de estudo e pesquisa. A pesquisa é importante para o avanço do conhecimento. Um bibliotecário de catalogação lida e organiza uma variedade de áreas temáticas. Assim, precisa estudar e pesquisar sistematicamente os assuntos, terminologias e linguagens com os quais não está familiarizado. A capacidade de localizar informações para a resolução de problemas e tomada de decisões é um aspecto embutido nos processos catalográficos. Os usuários precisam tomar decisões, a coleção deve esclarecer dúvidas.

Autodisciplina:

É o melhor controle. O monitoramento ético e do trabalho é o melhor controle de qualidade. O bibliotecário de catalogação deve dominar a sua atividade, desenvolver o seu plano diário, semanal e mensal, para aumentar a produtividade e responsividade da catalográfica. Estabelecer, ainda, os planos de aprimoramento técnico para manter e melhorar o desempenho catalográfico. Investir na carreira é crucial para o sucesso pessoal e a satisfação do público. O ser catalogador envolve examinar itens físicos e/ou eletrônicos. Envolve, também, escanear ou digitar; sentar-se para ler em uma tela de dispositivo computacional, por longos períodos. Isso pode causar problemas de saúde. É preciso cuidar da saúde para evitar doenças ocupacionais ou problemas físicos e oculares. Para ser produtivo e resiliente nas dificuldades da atividade, a estação de trabalho deve ser configurada para apoiar, confortavelmente, a postura do corpo. O bibliotecário de catalogação, apesar de trabalhar em equipe, atua de forma independente para não se distrair com ruídos de fundo e concentrar-se com as peculiaridades do tratamento da informação.

Considerações:

O êxito do bibliotecário de catalogação, no desempenho de sua atividade, requer o comprometimento com a busca e aquisição de conhecimento sobre as inovações teóricas e técnicas da catalogação e a sua aplicação nos processos catalográficos. As atribuições e deveres deste profissional são importantes porque a equipe da biblioteca e o público usuário confiam e fazem uso das informações inseridas no sistema bibliográfico. Ele precisa ser diligente e sistemático ao alimentar as bases bibliográficas com precisão e consistência, para que possam ser facilmente consultadas. Manter uma autoavaliação constante, ao questionar se:  Tenho as qualidades essenciais para esta posição? E comprometer-se em realizar coisas que lhe permita responder sempre: sim.

Indicação de leitura:

Myung Gi Sung. Ten Essential Qualities for Success: A New Cataloging Librarian’s Guide from a Supervisor’s Perspective. Public Libraries Online, may 2013. Disponível em: https://urless.in/hEsvE


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FERNANDO MODESTO

Bibliotecário e Mestre pela PUC-Campinas, Doutor em Comunicações pela ECA/USP e Professor do departamento de Biblioteconomia e Documentação da ECA/USP.