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O OBSOLETISMO DAS INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS

Recentemente, assisti palestra sobre preservação e fragilidade de conteúdos digitais. Foi durante o II Simpósio Internacional de Bibliotecas Digitais, promovidos pela UNICAMP em parceria com a USP, UNESP e outras instituições. O interessante da exposição foi alertar para a contradição das inovações tecnológicas. O que deveria ser uma ferramenta ou recursos para melhor tratamento e gestão da volumosa e crescente massa de informações digitais, acaba sendo também instrumento de sua eliminação.

Um dos palestrantes sobre o tema, Howard Besser (http://besser.tsoa.nyu.edu/howard), enfatizou a necessidade de desenvolvermos intenso esforço de gestão na preservação da informação digital.

O crescimento da tecnicalidade na produção, manipulação e tratamento do conteúdo digital vai ampliando o problema do embaralhar de métodos e sistemas. O resultado pode ser a longo prazo, por exemplo, encontrar as chaves que permitam decodificar os conteúdos comprimidos ou criptografados, em 50 anos talvez seja impossível saber como abri-los.

No atual estágio do ambiente digital mostra-se importante definir procedimentos sobre o que se deve guardar ou salvar e o que será descartado ou apagado. As inovações tecnológicas continuamente se modificam. Novos recursos alteram substancialmente os recursos tecnológicos anteriores. Neste sentido, alguns procedimentos relacionados à preservação podem ser estabelecidos, tais como:

Refreshing - sugere a idéia de que arquivo em suporte antigo possa ser mudado para um suporte e/ou suportes que possibilite a leitura do conteúdo continuamente. Mover o arquivo para outros extratos físicos recebe então a denominação de "refrescar".

Migração - é o procedimento de migrar para outro suporte ou lugar físico não apenas o conteúdo digital, mas também o formato do arquivo de forma a poder ser acessível a cada inovação tecnológica.

Emulação - é o processo de fazer o refreshing, mantendo o formato original do arquivo e criando um programa que o leia. Entretanto, não há garantia de preservar o formato integral do arquivo (os parâmetros de formatação determinados pelo software original de produção do conteúdo). Caso exemplar é tentar abrir e ler arquivos de textos elaborados em antigos processadores de textos como o Wordstar (editor de sucesso no mercado a pouca mais de quinze anos), com editores atuais como o Word 2000. Aliás, até a denominação: processador para editor ilustra a mudança desses sistemas de elaboração de texto eletrônico.

Outro aspecto, é que a mudança de formato de um arquivo muda sua estrutura. Assim, por exemplo, ao tratar de arquivos de imagem digital é necessário cuidado com a sua fragilidade de estrutura afetando sua perfeita visualização ou definição.

Com a preocupação de preservar conteúdos digitais torna-se impossível às organizações, em especial as bibliotecas, manterem equipamentos de hardware e software para cada tipologia de formatos digitais. Seria como manter verdadeiros museus tecnológicos. Qual biblioteca ainda não possui perdido em algum disquete de 5 ¼, conteúdos que não consegue acessar pela falta de drives de leitura nos micros atuais? Para as bibliotecas, há que mudar de paradigma, não se preocupar com a guarda do suporte, mas com a preservação do conteúdo digital. Nos últimos anos vários artigos têm sido publicados sobre o tema.

Para algumas pessoas ou bibliotecários, isto pode não ser uma preocupação imediata. Pode-se pensar em deixar que a própria tecnologia crie meios de recuperação dos conteúdos digitais em seus diversos formatos. Deixar no futuro a solução do problema já manifestado pode ser um grave risco ao tempo presente.

Por experiência própria vivenciei a situação desta que chamo de "obsoletismo das inovações tecnológicas". Tendo planejado a configuração de meu computador pessoal para cinco anos, mal chegou a um ano e meio. À questão de um mês decidi ampliar o espaço do disco-rígido (HD) de "meros" 20 Gigabytes para 80 GB. Não são apenas as bibliotecas que têm problemas de espaços físicos.

Resolvi migrar para a nova mídia, os arquivos espalhados em inúmeros disquetes e alguns CDs. Tais suportes de armazenamento proliferam como insetos. Com os nomes estranhos que lhes damos, passando o tempo nem lembramos mais do seu significado. Alguns arquivos possuem denominações que parecem siglas (indecifráveis) decorrentes das limitações dos arquivos em DOS restritos a oito dígitos.

Após garimpar uma boa marca de HD na "Santa Efigênia", levei o equipamento a uma assistência técnica para instalação e respectiva migração dos conteúdos digitais. Um serviço de no máximo Cr$ 70 reais.

Duas semanas e mil reais depois, consegui instalar o novo HD e migrar os arquivos, bem como obtive junto um micro praticamente novo se não fosse o aproveitamento do mesmo gabinete e do gravador de CD.

O que aconteceu de diferente em uma simples troca de disco-rígido? Simplesmente, a placa-mãe instalada no computador não aceitou adotar um disco maior (Mãe ingrata). Dependendo da configuração das Bios, as placas só reconhecem um determinado tamanho de HD.

No caso narrado, embora o HD fosse de 80 GB, fisicamente a configuração antiga reconhecia 30 GB. Para aproveitar toda potencialidade do novo disco foi necessário instalar nova placa-mãe e conseqüente configuração de processador. Indo de um Pentium 3 para um compatível Pentium 4. Ilustra-se que nem sempre trocar o HD é solução para ampliar o espaço se não houver recursos financeiros para atualizar todo a coleção de equipamentos computacionais da biblioteca. Certamente, para minorar a situação orçamentária pode ser necessário adotar uma política de eliminação de arquivos inúteis como tradicionalmente se estabelece com a política de desbastamento da coleção.

Concluindo minha desventura de preservação digital, pensei valer a pena o custo de uma nova placa-mãe. Poderia aproveitar as demais peças necessárias para minha navegação na Internet. A surpresa, placa de modem (USROBOTIC) padrão de mercado a menos de cinco anos tinha que ser descartada, pois era incompatível com nova placa, nem havia mais espaço para tais tipos de configuração de placa. Mesmo a placa para saída USB recém comprada para modernizar a conexão de novos periféricos ao computador precisou ser descartada. A nova placa-mãe, generosa, já oferecia o recurso.

Prezado leitor e estimado colega bibliotecário, o que concluímos da questão referente à preservação e ao obsoletismo tecnológico? É algo que pode até nos tirar a tranqüilidade mental e principalmente financeira, mas para a qual não há solução definitiva.

Caso você tenha necessidade de promover migração de seus conteúdos digitais ou realizar uma pequena atualização de seu equipamento (486, Pentium II ou III), tenho uma boa coleção de peças em ótimo estado: placa-mãe, modem de marca, conexões USB e um espaçoso HD de 20 GB para conteúdos digitais magros. Além de um conjunto de bons softwares que não rodam em XP. Tudo a preço de ocasião para preservar o amigo.


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FERNANDO MODESTO

Bibliotecário e Mestre pela PUC-Campinas, Doutor em Comunicações pela ECA/USP e Professor do departamento de Biblioteconomia e Documentação da ECA/USP.