MEDIAÇÃO DA INFORMAÇÃO


  • Reflexões sobre a Mediação da Informação, englobando aspectos teóricos e práticos.

INFORMAÇÃO É PODER. É MESMO?

Se informação é poder, o bibliotecário deveria ser a categoria profissional mais importante entre todas as que existem e sobreviveram às transformações do mundo. Mais do que isso, deveria dominar o mundo. Aliás, de há muito já deveria tê-lo dominado. O poder deveria estar com a categoria que lida com a informação e o bibliotecário tem a informação como seu objeto. Ou não?

 

A pergunta que se apresenta é: o mundo está nas mãos dos bibliotecários? Poder e bibliotecário pode ser considerada uma redundância? Os bibliotecários dominam o mundo?

 

Há um livro de Brandon Sanderson chamado “Alcatraz contra os bibliotecários do mal” (São Paulo: Benvirá, 2010. 288p). Quando o vi em uma livraria corri para comprá-lo. Fui atraído pela ideia dos bibliotecários serem do mal. Convivi com a concepção de que os bibliotecários são do bem, estão sempre preocupados com os interesses do seu público, dos seus usuários. No livro, uma ficção, os bibliotecários são apresentados como os que dominam o mundo. E o fazem a partir de mentiras, de manipulações da história, da ciência, do conhecimento, das informações, etc. Iludem as pessoas veiculando uma realidade que atende apenas a seus, dos bibliotecários, interesses. Fazem de tudo para manter o poder que conseguiram. Alcatraz é o herói que salvará o mundo desses terríveis agentes do mal. No segundo livro da série (e último a ser lançado até o momento) (Alcatraz contra os ossos do escrivão. São Paulo: Benvirá, 2011. 287p.), ficamos sabendo que a sede da organização dos bibliotecários é a Biblioteca de Alexandria. E Alcatraz consegue penetrar nos intestinos dessa instituição. Lógico que a saga continuará, para gáudio dos que se identificam com o herói ou para nós, bibliotecários que nos vemos retratados de maneira diferente da que estamos habituados.

 

Na página 97 do primeiro livro, o personagem vovô Smedry diz: “Informação. Esse é o verdadeiro poder neste mundo.” Um pouco mais abaixo, ele continua: “Informação. Os Bibliotecários controlam a informação nesta cidade, neste país inteiro. Eles controlam o que é lido, o que é visto e o que é aprendido. Por causa disso, eles têm o poder.” No entanto, na página 99 o mesmo personagem afirma, falando da luta contra os Bibliotecários: “Nossa arma é a informação.”.

Apenas para alertar possíveis leitores incautos, atraídos pelos parágrafos anteriores: o livro é uma ficção, com uma história pobre, calcada nas de Harry Potter. Aliás, creio que a proposta do autor é a de cobrir o vácuo deixado pelo fim do famoso bruxinho. A capa do primeiro livro apresenta o personagem Alcatraz como uma cópia de Harry Potter.

 

Trouxe o livro de Alcatraz para a discussão, apenas porque nele os bibliotecários são entendidos como agentes do mal, atuando com informação e, dessa forma, detentores de poder e dominação. Também porque o autor enfatiza que o poder dos bibliotecários é dado pela informação. Mas, ao mesmo, as armas dos que se opõem aos Bibliotecários também é a informação.

 

Os Bibliotecários do mal detêm a informação. Será que, sendo bonzinhos, dividimos, benevolamente, o poder com toda a sociedade?

 

A ideia da bondade do bibliotecário nos leva a um entendimento errôneo de que somos imparciais, neutros.

 

Se a informação é poder, e todo poder pressupõe e tem como sustentação a influência, a interferência, etc., como pode o profissional que lida com a informação ser neutro e imparcial e, ao mesmo tempo, se revestir, se preencher de poder?

 

O imbricamento entre poder e neutralidade, entre poder e imparcialidade, é inviável.

 

Por que o poder da informação, defendido pelos que transitam e circundam a área, não está presente nela?

 

Será que informação é poder ou será que essa afirmação não está na ideia errônea de que a informação é coisa, é tangível, é materializada?

 

A informação é intangível, é subjetiva. Dessa forma, não se apresenta construída, formalizada, pois é dependente tanto dos que a produzem, como dos que a medeiam, dos espaços e momentos de mediação, das formas e linguagens dos suportes que ela se utiliza para ser veiculada e, em especial, dos que, ao final, interagem com ela. A informação não é concreta, ao contrário, ela vai se construindo, e se constrói de inúmeros interesses. Há sempre conflitos embutidos nela, a constituindo, a construindo. O domínio da linguagem, por exemplo, atrelado a um discurso ideológico hegemônico, tende a pender para um lado (embora não existam, maniqueisticamente, apenas dois); o controle das mídias, dos equipamentos informacionais, também resulta na predominância de determinados interesses; a presença do dominador como “hóspede” nos dominados, como nos lembra Paulo Freire, também interfere na busca ingênua por um impossível equilíbrio.  

 

Quando dizemos que informação é poder, de qual informação estamos falando? Qual a concepção de informação que dá sustentação e base àquela afirmação? O poder, de fato, está vinculado a quem, se entendendo imparcial e neutro, armazena, organiza e dissemina a informação?

 

Entendo o bibliotecário como o profissional que atua com uma “possível”, uma “latente”, uma “quase”, uma “talvez” informação. A denominei como “protoinformação”. O bibliotecário, os espaços onde atua, o momento em que ocorre a mediação, são partes e segmentos de construção da informação. Assim, não a detemos, não a temos por inteira. De igual maneira, esses mesmos segmentos são momentos de interferência nessa construção.

 

Além da concepção de informação é preciso também discutir e tornar clara a concepção de poder. Mas, como dizia Júlio Gouveia, apresentando a primeira versão para a televisão do Sítio do Picapau Amarelo, “essa é uma outra história que fica para uma outra vez”.


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OSWALDO FRANCISCO DE ALMEIDA JÚNIOR

Professor associado do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Estadual de Londrina. Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UNESP/Marília. Doutor e Mestre em Ciência da Comunicação pela ECA/USP. Professor colaborador do Programa de Pós-Graduação da UFCA- Cariri - Mantenedor do Site.