OBRAS RARAS


HIPÓLITO DA COSTA E O CORREIO BRASILIENSE

Hipólito José da Costa (1774-1823), o fundador do jornalismo brasileiro, nasceu na Colônia do Sacramento, o único povoamento português no Rio de la Plata, hoje Uruguai. Depois de estudar no Rio de Janeiro mudou-se para Coimbra, onde se formou em Direito e Filosofia. De 1798 a 1800 foi representante do governo português em Filadélfia, nos Estados Unidos, e mais tarde “adido” cultural em Londres. Certa vez, nessa época, ao tentar entrar em Portugal, foi preso pela Inquisição, acusado de ser maçon (consta que sua ida aos Estados Unidos tenha sido recheada de contatos com a Maçonaria). Apesar de seu bom relacionamento com a nobreza inglesa, Hipólito só pode escapar da prisão após três anos, quando foi para a Espanha usando um disfarce, retornando à Londres logo em seguida. Foi então que sua função de editor e principal autor do Correio Brasiliense, ou Armazém Literário (1808-1822) – considerado o primeiro periódico brasileiro, embora publicado na Inglaterra - teve início.

 

Hipólito era um liberal, um cosmopolita, um patriota sincero e um grande político. Como não poderia deixar de ser, o Correio se caracterizou por denúncias de má conduta de políticos portugueses, casos de nepotismo, suborno e abusos de poder, inclusive por parte da Igreja. Ele conhecia bem a vida em Portugal, pois trabalhara com frei José Mariano da Conceição Velloso em 1800 como um dos diretores literários da Oficina do Arco do Cego, casa impressora cujo objetivo era publicar obras de interesse para o melhoramento da economia brasileira. Naturalmente não apenas denúncias eram assunto do periódico de um homem letrado como Costa. Havia notícias de todas as partes do mundo e ensaios em literatura e cultura. Mas, como se pode imaginar, as autoridades portuguesas não simpatizaram com o Correio, e vários escritores se engajaram na tarefa de atacá-lo através de outras publicações.

 

Um desses escritores foi Joaquim de Santo Agostinho de Brito França Galvão, a quem é atribuído o Reflexões sobre o Correio Braziliense. O livro, exemplo de feroz manifestação contra o periódico e seu autor, foi publicado anonimamente. Para isso, Galvão se debruçou sobre um ano (1809 a 1810) do Correio, artigo por artigo. Como usual, essa e outras manifestações contrárias contribuíram para aumentar a popularidade do magazine. Só restou à Corôa, então, proibir a entrada do Correio em Portugal e no Brasil, fato que colaborou sobremaneira para que ele se tornasse ainda mais popular e fosse contrabandeado em larga escala. De nada adiantaram os editais de proibição e punição re-editados três vezes até 1817. O jornal era lido por todos (diz-se que até mesmo pela Corte portuguesa, e alguns historiadores sustentam que Hipólito recebia dinheiro para não tecer comentários sobre o rei. Será?) e ao longo dos anos era cada vez mais estimado, principalmente no Brasil, tanto que, após a Independência, em 1822, Hipólito tornou-se embaixador do Brasil na Inglaterra. Morreu jovem, ainda, aos 49 anos de idade.

 

Como Hipólito mantinha o Correio financeiramente é, até hoje, objeto de estudo. Uns afirmam que o governo britânico custeava o jornal; outros são de opinião de que havia, mesmo, um acordo com o rei, nunca atacado pessoalmente. Seja como for, todos reconhecem a importância do jornal e de seu fundador que, de longe, plantava idéias nas mentes de brasileiros, influenciando os cursos da nossa história.

 

Até a próxima!

 

 

O presente texto é uma tradução adaptada de verbete do livro de Dagmar Schaeffer Portuguese Exploration to the West and the formation of Brazil (1450-1800), um catálogo de exposição realizada na John Carter Brown Library, Providence, EUA, em 1988.

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VALERIA GAUZ

Tradutora, mestra e doutora em Ciência da Informação pelo IBICT, bibliotecária de livros raros desde 1982, é pesquisadora em Comunicação Científica e Patrimônio Bibliográfico, principalmente. Ocupou diversos cargos técnicos e administrativos durante 14 anos na Fundação Biblioteca Nacional, trabalhou na John Carter Brown Library, Brown University (EUA), de 1998 a 2005 e no Museu da República até 12 de março de 2019.