A CURVA DE UM MUNDO SEM CURVAS
Caminhei, quando pequeno, até o final da rua.
Meu pequeno mundo era restrito, tinha limites.
O mapa mundi, naquela época, era plano.
Sendo condescendente, um planalto.
Mas, com poucas curvas, menos ainda redondo.
A esquina era o fim.
Além dela nada havia. Apenas o precipício, o buraco,
o promontório, a queda, o vazio.
A curva era o limite de um mundo sem curvas.
O horizonte de minha vida chegava até o último
sobrado.
E foi assombrado que cheguei ao fim da rua.
Corajoso, embora minha coragem me levou ao medo.
O mundo existia depois dos meus olhos,
ultrapassava os domínios das luzes dos postes,
dos fios – que nunca soube de onde vinham.
Meu pai sumia na curva, mas sempre voltava.
Quem não voltou foi minha mãe:
a curva também não tinha volta.
E foi curvado que cheguei ao fim da rua.
O que vi pareceu o que já sabia.
A redundância.
A rua parecia reproduzida, imitada, reconstruída.
A cada rua, uma nova rua, a mesma.
E foi a esmo que cheguei no fim da rua.
Eu mesmo.
A coragem foi pouca. Olhei e voltei.
Ensimesmado, retornei. Para minha mãe.
A geografia era outra. O mapa com mais uma página.
E foi marcado que cheguei ao fim da rua.
Marcado pelo desconhecido, pela ânsia de conhecer.
Conhecer marcou minha vida, determinou minha sina.
A rua se perpetuou: depois da primeira esquina havia
outra.
Após ela, outra e outra e outra e outra.
Não sei quantas ainda até o fim da rua
ou da vida.