BIBLIOTECA ESCOLAR


  • Discussões, debates e reflexões sobre aspectos gerais e específicos da Biblioteca Escolar.

UMA PIADA DE MAU GOSTO

Qual será a razão pela qual os empresários da educação valorizam a biblioteca escolar – com bibliotecário?

 

Empresário nenhum investe num determinado negócio se for para ter prejuízo; portanto, a biblioteca deve fazer parte de um “pacote” complexo, no caso, em que cada parte se reflita no todo, e em que esse pacote faça parte de um marketing mais (ou menos) sofisticado, porém obviamente direcionado para a motivação da clientela, voltado para o sucesso e o lucro do empreendimento.

 

Explica-se: em geral, os pais ou responsáveis por alunos, que estejam à procura de uma primeira ou de uma nova escola para suas crianças, querem encontrar lá tudo que for possível para garantir um ensino de qualidade, a partir do concreto evidente; assim, verificam quais as vantagens oferecidas pela escola, em termos do tangível pedagógico, hoje representado por laboratórios variados, por computadores numerosos e por bibliotecas com bibliotecários. A escola que não dispuser dessas instalações e facilidades dificilmente será a eleita. As pessoas estão mais espertas e bem informadas: sabem que na sala de aula deverá estar o professor bem qualificado, que nos laboratórios haverá um especialista redundantemente especializado, seja em química, física ou biologia, por exemplo. Em informática, idem. E, na biblioteca, alguém com uma formação específica tal que não só organize e administre adequadamente a informação contida no acervo multimídia, bem como desenvolva atividades de dinamização informacional e ação cultural, além daquelas voltadas para a literacia em informação.

 

Por outro prisma, o MEC valoriza, por um determinado tipo de pontuação, bibliotecas universitárias da rede privada – de empresas, portanto – que almejam ascender no ranking geral, seja no processo de passagem de mera faculdade a centro universitário, deste a universidade, e assim por diante. O MEC, além de expressar sua política para as bibliotecas ligadas ao ensino e à educação universitária, tem respeitado a legislação brasileira para o setor. Até agora, também não tergiversou quanto ao seu pronunciamento sobre livros, leitura e biblioteca escolar.

 

Acontece que o MEC define as diretrizes, mas a educação é estadualizada e, assim, cada estado, por sua vez, decide como direcionar e operacionalizar de forma consoante essas diretrizes educacionais, isto é, a sua escola, o seu ensino e o que vem no bojo.

 

No estado de São Paulo, dito uma das “locomotivas” do País, essa interpretação ou esse entendimento das coisas segue essa mesma linha; porém, com um diferencial: a escola da rede pública que, até o início da década de 90, tinha uma legislação estadual bem clara sobre a biblioteca escolar, então valorizada como apoio e um dos baluartes da sala de aula, além de contar com um quadro próprio de bibliotecários (hoje desaparecido), apresenta um panorama obscuro e intrigante, por vários motivos. Vale dizer que a legislação em nosso estado, bem como todos os documentos inerentes à Constituição, na condição de Carta Magna, é aparentemente ignorada e desrespeitada no que tange a rede pública de ensino, em termos de biblioteca escolar.

 

Os inúmeros protestos do CRB-8 vêm sendo sistematicamente ignorados, da mesma forma como são ignorados o teor da lei e os preceitos de órgãos internacionais da maior respeitabilidade e seriedade, como a UNESCO e a IFLA.

 

Quando o questionamento vem com mais força de uma origem cuja importância fica difícil negar ou esconder, a Secretaria de Estado da Educação desconversa ou nega as evidências de repetidas matérias como, por exemplo, as que a jornalista Maria Rehder, do Jornal da Tarde, muito recentemente publicou sobre a situação das bibliotecas escolares, referentes a inúmeras e aleatórias escolas paulistas.

 

Como resposta, argumentos absurdos têm aparecido. Dentre eles, o de que as bibliotecas estão abertas e que aquelas fechadas só ocorrem em função de adequações em andamento, embora as reportagens mostrem um outro cenário.

 

Quanto aos recursos humanos, dizem na “cara dura” que as bibliotecas (aquelas que ainda perduram teimosamente) são geridas por professores readaptados (uma junta médica os designa ou indica para a biblioteca!?), ao arrepio da lei, ou por quem esteja disponível na escola – não importa quem. A conversa agora (a mais atual) é a de que alunos estagiários estariam assumindo as rotinas e os procedimentos da biblioteca escolar!

 

Além de ex-professora universitária e formadora de novos bibliotecários, sou também ex-bibliotecária escolar. Como tal, tive como ídolo e modelo profissional, a figura fantástica de Marlene Souza Santos, que foi bibliotecária do tradicional Colégio Rio Branco, mantido pelo Rotary Club, em São Paulo. Sempre adiante de seu tempo, Marlene tinha como uma de suas metas a formação de um corpo rotativo de aprendizes de auxiliar de biblioteca, entre seus alunos de todas as idades, que a auxiliavam e, ao mesmo tempo, aprendiam a conhecer melhor a potencialidade e as rotinas da biblioteca em que atuavam, fosse na biblioteca dos menores (infantil), dos médios ou dos grandes, onde o nível desse preparo como ajudantes-usuários já lhes garantia mais autonomia e desenvoltura na busca e no encontro da informação/do livro, graças ao tino dessa grande bibliotecária-educadora. Mas, ela era a maestrina profissional, exatamente por ser a bibliotecária da casa.

 

A Secretaria de Estado da Educação, em São Paulo, está apregoando, alto e bom som, que terá estagiários-alunos à  frente das bibliotecas escolares da rede pública, cometendo, mais uma vez, uma imprudência e um desplante ao parecer ignorar acintosamente que estágio é um assunto definido e circunscrito por normas específicas, pelas quais a figura do estagiário existe na teoria e pode existir na prática, desde que sob a supervisão devidamente registrada de um professor universitário da área de Biblioteconomia ou de um profissional em atividade, registrado e quite com o Conselho de Biblioteconomia, no caso o CRB-8ª Região.

 

Assim, vai daí o título deste texto: trata-se de uma “brincadeirinha” da Secretaria de Estado da Educação, de São Paulo, ou, diferentemente, é uma piada de mau gosto? De qualquer forma, é um desrespeito às famílias de cidadãos contribuintes que preferiram eleger a rede pública para a educação escolar de seus filhos e esperam lá encontrar um ensino de qualidade, com todo o aparato pedagógico-informacional que isso requer, e que leve a bons resultados. (MHTCB)


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MARILUCIA BERNARDI

Formada pela PUCCampinas. Atualmente elabora projetos para formação de Biblioteca Particular (Pessoal), oferece apoio a Bibliotecas Escolares e é aluna da Faculdade da Terceira Idade, da UNIVAP, em Campos do Jordão. Ministrou aulas de Literatura e Comunicação, por dois anos, na Faculdade da Terceira Idade. Atuou na Escola Estadual Prof. Theodoro Corrêa Cintra, em Campos do Jordão, pela ONG AMECampos do Jordão. Trabalhou na Fundação Getúlio Vargas de São Paulo; na Metal Leve; chefiou a Biblioteca da Faculdade Anhembi-Morumbi e foi encarregada da biblioteca do Colégio Santa Maria. Possui textos publicados e ministrou diversas palestras sobre Biblioteca Escolar.?

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MARIA HELENA T. C. BARROS

Livre-docente em Disseminação da Informação (UNESP); Doutora em Ciências da Comunicação (USP); Mestre em Biblioteconomia (PUCCAMP); Especialista em Ação Cultural (USP); Formada em Biblioteconomia e Cultura Geral (Fac. Filosofia Sedes Sapientiae); Autora de livros e artigos científicos publicados no Brasil e no Exterior